Virgínia partiu!
Um destes dias
percorrendo o facebook, encontrei este texto...
Todos os dias tenho agradecido o simples facto de acordar.
Estas últimas 6 semanas estão a ser as mais difíceis da minha vida. Sei que
esta partilha será um choque para muitos, e pensei muito antes de a fazer...
Há quase 6 semanas foi-me detectado Cancro Intra Hepático, nas vias
biliares, estágio 4, sem cura, previsão de pouco tempo de vida.
Cancro raríssimo, que os médicos não conseguem sequer explicar como alguém
com a minha idade o tem. Como me disse um médico a quem fui pedir 2a opinião,
com +30 anos de carreira "É daqueles casos que sabemos que existem, mas que
ninguém conhece ninguém".
Estive 4 semanas no hospital. Comecei quimio de urgência, tive de parar
porque as vias biliares estavam obstruídas (e o fígado não aguentaria a
toxicidade). Fui para intervenção no Curry Cabral, que teve complicações
sérias, como uma hemorrogia interna em que poderia não ter sobrevivido.
Sobrevivi!
Neste momento não me conseguem retomar nenhum tratamento que permita tentar
a redução do tamanho do cancro (quando foi detectado tinha 11 cms, e estava
cada vez maior e metastizado), para que possa ter um pouco mais de qualidade de
vida nestes tempos (menos dor... mais energia, que tem sido pouca... ). O
cenário não é o melhor.
Estou a ser acompanhada no HBA, Champalimaud, com o ter recorrido a CUF e
outras opiniões externas. As opiniões são unânimes.
Aproveito esta partilha para vos fazer alguns pedidos... até porque em
nenhum momento tenciono que tenham pena de mim, me considerem uma vítima, e
muito menos demagógica
1- Dêem sangue. Sou dadora há imensos anos, mas não imaginam a gratidão que
senti em cada transfusão (foram umas 6) que me foi feita, por alguém se ter
predisposto a dar parte de si a quem precisa. As reservas estão baixas, não
custa muito.
Quem tiver a oportunidade de o fazer, mande-me fotos!! Vou adorar saber que
"inspirei"
2- Não adiem os vossos exames de rotina. Tenho ecografias a todos os órgãos
abdominais que tinha feito em fevereiro de 2020, e em março de 2021 é-me
detectado um cancro, com um tumor de 11cm sem cura, e que não pára de
crescer... Não descurem da vossa saúde.
3- Aproveitem a vida. Dêem valor ao pouco que por vezes parece que têm...
Fica também um outro ENORME PEDIDO. NÃO me liguem para o telemóvel ( não
tenho atendido nenhum telefonema nem o irei fazer), nem contactem as minhas
irmãs... como devem imaginar,
está a ser demasiado para todos os que me são mais próximos.
Adoraria sim receber mensagens vossas, por mensagem de Facebook, por
exemplo, com alguma boa recordação que tenham comigo... com alguma fotografia
que tirámos no passado... com alguma palavra que me queiram dizer. Garanto que
verei todas.
Quero aproveitar também para agradecer às minhas irmãs e ao João, que têm
sido o meu grande apoio. Que deixaram as suas vidas em suspenso para virem
cuidar de mim... que me mostram todos os dias que me amam incondicionalmente.
Quero também agradecer à fantástica equipa que tenho da Lisbon, que têm
sido imparáveis, e que têm levado o barco a bom porto (para além do amor e
carinho que sinto sempre do vosso lado).
Ao grupo restricto de pessoas que contei anteriormente, obrigada pela vossa
amizade, carinho, mimos, e respeito que têm tido pelo meu espaço. Nunca
duvidei, mas vejo com clareza hoje a pessoa sortuda que sou, e as pessoas
maravilhosas que me rodeiam.
Virginia Coutinho
Dias depois esbarrei neste outro texto...
Infelizmente
a nossa irmã Virgínia Coutinho, Gi para os amigos, partiu ontem, 20 de Abril.
Não haverá
velório, mas uma celebração (ao ar livre como tanto gostava de estar...) para
algumas pessoas mais chegadas, em data e dia a ser anunciados (infelizmente com
a situação que vivemos sabemos que teremos dificuldade em juntar todos que lhe
eram importantes).
Este será
"Um muito obrigada" que ela quis preparar a todos os que a ajudaram a
ser uma pessoa melhor, e mais feliz.
Nestas
semanas esteve também a preparar um fundo, através da Associação Girls Move,
para ajudar à criação de uma nova geração de mulheres líderes em Moçambique -
mais especificamente através do projecto de mentoria Tech4Good. Dizia ela que
este era um ponto bom no que aconteceu, poder planear, dizer às pessoas que as
amava. Lamenta não ter visto todos os que gostava... Será o fundo Virgínia
Coutinho para ajudar jovens adolescentes, em Moçambique, país de que tanto
gostava. Para além do seu donativo, fica o pedido para quem quiser contribuir
para que o mundo bonito que a Gi acreditava que conseguia ser, esteja a mais um
passo de o ser.
Se quiserem
fazer parte deste projecto que era tão próximo ao coração da Gi podem fazê-lo
para:
Associação
Girls Move Portugal
IBAN:
PT50003300004548587001605
--
Esta conta
de Facebook será desactivada dentro de três semanas. Obrigada a todos pelo carinho
que sentimos que tinham por ela.
Nota das
irmãs: Pedimos para, por favor, respeitarem a nossa privacidade e não nos
ligarem. Fiquem à vontade de nos enviar mensagem com o vosso carinho, mas
pedimos que respeitem esta altura tão dolorosa para todos nós.
E li, ainda, a sentida e merecida homenagem...
José Crespo de
Carvalho
Professor Catedrático; Presidente da Comissão Executiva – INDEG – ISCTE
Executive Education
Virgínia Coutinho
Deixo o que
posso deixar. Um artigo simples para dar força a um ser humano que se apaixonou
pela educação como forma de vida.
16 abr 2021,
00:08
Obervador
Era ainda uma miúda
quando entrou na minha sala de aula.
Tinha um ar curioso e
não provinha certamente de Lisboa.
Parecia mais velha do
que os mais miúdos e vinha ao que vinha: aprender, fazer um mestrado.
Dei-lhe uma cadeira.
Marcou-me como aluna. Sempre com questões pertinentes e onde não colocava de
lado, nunca, a vontade de saber e de saber porquê. Por vezes fazia-me lembrar o
livro Porquê, da Bertrand Editora, que tinha na minha estante
enquanto miúdo: 500 perguntas e 1000 respostas. Sempre uma resposta a mais para
a Virgínia, ou uma explicação a mais, ou um ângulo a mais, ou um ponto de vista
a mais. E um debate curioso, participativo, inteligente.
Não, não esteve lá
pelo canudo. Esteve lá para aprender. Esteve para trabalhar. Esteve para se
capacitar. Esteve para crescer. Tinha curiosidade, muita curiosidade
intelectual. E era de uma simplicidade atroz.
Perguntam-me, então,
porque escrevo sobre a Virgínia? Poucos a conhecem, ao Observador não importa,
não é um político/a ou um empresário/a notório/a. Porquê?
A Virgínia é a
fundadora e CEO da Lisbon Digital School (LDS). Uma escola que não é apenas um
centro de formação e que, desde a primeira hora que entrei para as funções que
desempenho, quis trazer para dentro do ISCTE Executive Education. Com a LDS
temos uma parceria para uma pós-graduação em applied digital marketing,
mesmo applied, mesmo digital marketing, mesmo
desenvolvida por profissionais de mercado para suprir necessidades de mercado.
E temos ainda mais uma meia dúzia de cursos de curta duração desenhados em
parceria.
Tudo começou a meu
pedido. Ao que a Virgínia de pronto acedeu. Logo firmámos um protocolo, pusemos
em marcha o comboio e vamos fazer desta próxima edição da pós-graduação
em applied digital marketing, uma edição dedicada à Virgínia. O
melhor grupo de alunos receberá um prémio Virgínia Coutinho.
É o mínimo que posso
fazer pela Virgínia. É o mínimo que posso fazer para a homenagear em vida. É o
mínimo que posso fazer a alguém que, tão novo, é apanhado por uma doença
traiçoeira, um cancro terminal, contra a ordem natural das coisas. É o mínimo
para quem, como a Virgínia, no seu percurso, tenha andado por onde tenha andado,
começou numa aula minha há cerca de dez anos e hoje é a líder de uma escola que
ela própria criou.
Se alguma coisa puder
dizer sobre a Virgínia, é que ela é a pessoa certa para se falar em educação e
em conhecimento. Ela é a pessoa certa para se falar no valor do trabalho. E no
valor do trabalho orientado para a formação. O valor e a diferença que faz ter
conhecimento. É isso que é o projeto da Virgínia: “O homem não é nada além do
que a educação faz dele” (Kant) poderia bem ser um mote seu.
A Virgínia partilhou
nas redes sociais, esta semana, um texto comovente sobre a sua doença: “Há
quase seis semanas foi-me detetado um cancro intra-hepático, nas vias biliares,
estágio 4, sem cura, com pouco tempo de vida”; “Neste momento não me conseguem
retomar nenhum tratamento que permita tentar a redução do tamanho do cancro
(quando detetado, tinha 11 cm e está cada vez maior e metastizado”; “Todos
os dias tenho agradecido o simples facto de acordar”; “É daqueles casos de
cancro que todos os médicos sabem que existe, mas que ninguém conhece alguém
que tenha tido.”
A Virgínia deixa-nos
três pedidos que, esses sim, são importantes fazer chegar a muita gente. Eu
junto um quarto pedido, que, estou certo, a Virgínia não se importará.
1. Deem sangue. “Sou dadora há imensos anos, mas não imaginam a gratidão que
senti em cada transfusão (foram umas seis) que me foi feita por alguém se ter
predisposto a dar parte de si a quem precisa. As reservas estão baixas, não
custa muito. Quem tiver oportunidade de o fazer mande-me fotos. Vou adorar
saber que inspirei.”
2. “Não adiem os vossos exames de rotina. Tenho ecografias de todos os órgãos
abdominais de Fevereiro de 2020 e, em Março de 2021, é-me detetado um tumor com
11 cm, sem cura, e que não para de crescer.”
3. “Aproveitem a vida. Deem valor ao pouco que por vezes parece que têm…”
4. Este acrescento eu, pelos 10 anos que levo de conhecimento da Virgínia:
eduquem-se. Porque a educação e o conhecimento farão diferença nas vossas
vidas.
E, finalmente, deixo o
que posso deixar. Um artigo simples para dar força a um ser humano que se
apaixonou pela educação como forma de vida. E um prémio Virgínia Coutinho para
o melhor grupo da pós-graduação em applied digital marketing.
E porque a Virgínia
tem muito ainda para nos dar, deixo-lhe aqui a minha homenagem mas, não menos,
toda a minha esperança. O meu obrigado e um “volta rápido”. Vamos continuar a
trabalhar. Força Virgínia.
Não conheci a Virgínia embora partilhe com ela a paixão pela educação e o enorme respeito pelo OUTRO!
São pessoas como a Virgínia que fazem falta ao mundo!
Até já!
Lola