sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Se me esqueceres



SE ME ESQUECERES

Quero que saibas

uma coisa.
Sabes como é:

se olho
a lua de cristal, o ramo vermelho
do lento outono à minha janela,
se toco
junto do lume
a impalpável cinza
ou o enrugado corpo da lenha,
tudo me leva para ti,
como se tudo o que existe,
aromas, luz, metais,
fosse pequenos barcos que navegam
até às tuas ilhas que me esperam.

Mas agora,

se pouco a pouco me deixas de amar
deixarei de te amar pouco a pouco.

Se de súbito

me esqueceres
não me procures,
porque já te terei esquecido.

Se julgas que é vasto e louco

o vento de bandeiras
que passa pela minha vida
e te resolves
a deixar-me na margem
do coração em que tenho raízes,
pensa
que nesse dia,
a essa hora
levantarei os braços
e as minhas raízes sairão
em busca de outra terra.

Porém

se todos os dias,
a toda a hora,
te sentes destinada a mim
com doçura implacável,
se todos os dias uma flor
uma flor te sobe aos lábios à minha procura,
ai meu amor, ai minha amada,
em mim todo esse fogo se repete,
em mim nada se apaga nem se esquece,
o meu amor alimenta-se do teu amor,
e enquanto viveres estará nos teus braços
sem sair dos meus.


 PABLO NERUDA, in POEMAS DE AMOR DE PABLO NERUDA-
Trad. de Nuno Júdice-Ed. bilingue (Dom Quixote, 2010)


Se  me esqueceres, Pedro voltarei ao mar onde me senti feliz sonhando o teu caminhar ao longo das ondas, manha cedinho, procurando o alento que, por vezes, te vai abandonando;

Se me esqueceres, Pedro escutarei a tua voz delicada e melodiosa, pela maresia, envolvendo-me num abraço único e sussurrando de modo incomparável: "Estas tão linda..."

Se me esqueceres, Pedro eu guarde-te-ei sempre no meu corpo e na minha alma pois és e serás continuadamente a memoria encantadora dos meus sonhos existenciais!

Se me esqueceres, Pedro... bem, confesso que não sei acreditar...
Porquê?
 Pela inutilidade amarga de um (des)encontro depois de uma década de um querer-te, silenciosamente, prazeroso...



Lola