domingo, 26 de julho de 2020

A escola


A minha escola primária (Cerco do Porto)
A escola
A escola é um meio para querermos o que não temos. A vida, depois, nos ensina a termos aquilo que não queremos. Entre a escola e a vida resta-nos ser verdadeiros e confessar aos mais jovens que nós também não sabemos e que, nós, professores e pais, também estamos à procura de respostas.

Mia Couto
Em "Os sete sapatos sujos"
Escola é uma palavra exageradamente doce...
porém, sem cor, pois está envolvida de um colorido infindável e de uma ternura tão macia que todos os olhares sentidos nunca conseguirão abranger!
A escola é espaço e tempo de belissimas, misteriosas e entranhadas estórias de vidas e sonhos vindouros!
Adoro a escola!
A minha escola de hoje.
Lola

Acorda. Vem Até ao mar.




Acorda. Vem Até ao mar.

Acorda. Vem
Até ao mar.
As ondas têm
Um vago amar.
Há um calmo fim
Ao pensamento
No mar, assim
Cessado o vento.
A hora salga
De calma a dor…
Uma e outra alga
Doem-lhe à flor…
Vem tão comigo
Por tal caminho
Que eu contigo
Me creia sozinho…
Tanto pertenças
Ao meu pensar
Que as duas presenças -
Tua e do mar -
Não sejam mais
Que a calma triste
Sem nexo ou ais
Que em mim existe…
Ah, desejar!
Amar, sofrer!
Eu, tu e o mar…
Como dói ser!
Vem ajudar
Meu pensamento
A dispersar
P’lo mar sem vento.


Fernando Pessoa,
2-10-1915
In "Poesia 1902-1917"




                                                Lola

Este Rio



Este Rio

Este rio que traz o mar cá dentro
e sendo mar não deixa de ser rio
este rio com margens que são centro
e sendo margens são nosso navio.

Este rio que volta quando parte
e quando parte leva as suas margens
este rio que vai a toda a parte
e mesmo em casa é todas as viagens.

Este rio que sabe a mar profundo
e dentro da cidade é rua e rio
e em cada rua dá a volta ao mundo
e de Lisboa fez nosso navio.

04-02-2017

Manuel Alegre, em "Bairro Ocidental” (2015)

                                                Lola

quarta-feira, 8 de julho de 2020

A grandeza da mãe Paula




A grandeza da mãe Paula

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·         Se perdesse uma filha num homicídio brutal, seria capaz de perdoar? E se o homem que a matou pusesse termo à vida, seria capaz de enviar condolências à família do assassino?

Estas são perguntas com as quais ninguém devia ser forçado a deter-se. Que inquietariam qualquer pai ou mãe. Estas são perguntas hostis de resposta tortuosa. Beatriz Lebre foi morta de forma cobarde por Rúben Couto, com quem mantinha um relacionamento amoroso. O seu corpo foi lançado ao rio Tejo e, cerca de um mês depois desse dia terrível, o homicida confesso pôs termo à vida na prisão. Mas nesta história trágica avulta uma lição maior. A da mãe da vítima, Paula Bochecha Lebre. "As minhas condolências à família de Rúben Couto. Não é possível medir sofrimento, mas uma morte é uma morte. Quando morre uma criança ou um jovem é sempre uma perda para as famílias como para a sociedade", escreveu ela no Facebook, abrindo o peito frágil de mãe, mas mantendo inviolável a decência e um profundo sentido de humanidade que não a deixa defender a pena capital. Ainda que fosse entendível que a desejasse para o carrasco da filha. "Prefiro um culpado livre do que um inocente no corredor da morte".

Perderam-se dois jovens em circunstâncias dramáticas. Sobrou uma dor corrosiva para as famílias. Mas ficou-nos como curativo espiritual e sobressalto cívico esta enorme, enormíssima, dádiva de Paula. Ter a capacidade de preservar os valores morais, civilizacionais, mesmo que habite nela uma dor infinitamente maior do que o corpo, é de uma grandeza ímpar e, por isso, merecedora da nossa vénia. Num mundo tão ensimesmado com futilidades, tão desgastado por ódios boçais e vaidades fátuas, tudo seria melhor com pessoas como Paula, com mulheres como Paula, com mães como Paula.
Senhor presidente da República, quer condecorar um português verdadeiramente merecedor? Ei-lo: chama-se Paula Bochecha Lebre, cidadã extraordinária.

Pedro Ivo Carvalho
JN, 8 de Julho de 2020




Eu, que sei de cor a dor de perder uma filha, sensivelmente da mesma idade, ainda que não devido à brutalidade assassina de outrém...
...não sei mesmo se 
conseguiria perdoar o autor de tamanha e amarga dor!



                                                Lola