sábado, 25 de novembro de 2017

Era Setembro




Era Setembro



Era Setembro, já no final do verão.
O Outono dava um ar da sua graça, espreitava discreto por entre os raios de sol.
O mar calmo convidava a um passeio na areia, os cheiros eram intensos, cheirava a Outono.
Há sempre um clima mágico nesta praia, qualquer semelhança com o paraíso não é coincidência.
Passeámos abraçados e só o calor do teu corpo não me fez regelar, estava magra e entre a pele e o osso o espaço não abundava.
A minha saúde era parca mas a vida, essa sempre foi imensa.
Apesar do frio aquele paraíso aconchegou-nos para ficarmos.
Abraçada a ti, deslumbrada pelo mar, adormeci.
Dormi umas horas, o sono era meu companheiro diário, qualquer que fosse o mínimo esforço que fizesse.
Era uma etapa eu sabia!
Quando acordei estava tapada com uma toalha da cor do céu.
Um acto de carinho me cobriu do frio naquele fim de dia.
O sol já se ajeitava para dormir, ia-se encostando ao mar, naquele abraço que sempre dão antes de se apagar a luz.
Assistimos emocionados ao pôr-do-sol, tentei disfarçar a tristeza de ter adormecido e teres ficado só, sei que sabias que era mais forte que eu, mas causava-me muita tristeza, quando estávamos juntos não queria adormecer.
Estranhamente, parecias empolgado. Talvez uma criança quando faz uma marotice.
És engraçadíssimo nas tuas expressões de felicidade.
Os olhos ficam tão verdes que brilham mais que esmeraldas e os lábios ficam de um rosa clarinho parecendo reflectir o brilho do olhar.
Sei-te de cor!
Tinhas feito das tuas!
Abraçaste-me e subimos a escadaria que nos traz da praia até á vila, no cimo existe um miradouro, que quem como eu vive no mundo dos sonhos, seria o local ideal para viver, tal é a imensidão da varanda que abraça o mar.
Sabes que amo o mar, não estranhei a ida até ali.
Estavas impaciente, não entendia a razão.
Em ligeiros desvios ias-me deslocando, parecias querer mostrar-me algo.
E ao olhar para a areia percebi!
Enternecida olhei um enorme desenho que fizeste na areia para mim.
Enquanto dormi desenhas-te uma mensagem de amor de tal dimensão que até as estrelas no céu a avistavam.
Foi o desenho mais bonito que recebi da vida!
Chorei, claro ou não fosse eu a tal que carrega o mar nos olhos, mas chorei de emoção!
A vida estava a roubar muito de mim, mas como nos sonhos dos poetas tinha colocado no meu caminho alguém que se assemelhava a um anjo protector.
Ao chegar ao hotel, havia uma mensagem para mim.
Era lindíssima, alguém que gosta do que escrevo, e que com as palavras como ligação entre um leitor e um escritor, criou laços de afecto.
A mensagem era:
“ Hoje a Poesia passeou-se na Zambujeira do Mar”
E eu?
Eu, feliz adormeci a sorrir.

( Todos os direitos reservados )



Lola




Prazeres da vida


Prazeres da vida
As coisas que mais prazer me deram na vida
Agrafar mais, carimbar mais, vestir a camisola do Benfica aos quinze anos no primeiro treino, as Variações Goldberg, chegar da mata em Angola, os primeiros passos da minha filha Zézinha, eu a ensinar a Isabel a ler, o meu primo António a explicar-me Se a mãe sêsse o pai puzia gravata, um abraço do meu tio João Maria, o meu pai a deixar-me 

Agrafar, carimbar, cortar uma página pelo picotado, fazer buraquinhos numa folha com aquela maquineta de fazer buraquinhos, o palrar de um bebé, calar de súbito o som a meio de uma ária de ópera, esmagar as bolhinhas de uma folha de plástico transparente, ver da janela, lá em baixo, o primeiro pássaro da manhã, olhar o retrato do Papa Inocêncio de Velázquez, meter na boca um pé de criança de três meses, uma finta de Garrincha na televisão, o sorriso súbito de certas mulheres, um sino de aldeia ao fim da tarde, as luzes de Beja à noite na planície, a Serra da Estrela vista da varanda dos meus avós quando eu tinha cinco anos, a minha filha Joana, pequenina, a desenhar a sua primeira árvore, o meu avô a fazer-me uma festa comigo quase a adormecer, o tenente, quando eu era cadete, a ordenar a Marcha lento e à vontade, um pirilampo no quintal a meio da noite, a voz da minha mãe a recitar António Nobre, um gato caminhando devagarinho no muro da buganvília, montar uma zebra de pau no carrossel do oito, dizer gosto de ti para um rosto que aumenta, os olhos azuis da Avó Querida quando me chamava meu amor, agrafar mais, carimbar mais, uma mulher a murmurar Meu Deus na almofada, o pneu afinal não ter furo nenhum, o médico junto à minha cama Vou dar-lhe alta, um falcão a passar junto à janela, o guardanapo com uma rã a saltar ao eixo, começar a ver o fundo do prato quando me davam sopa, beber água da bilha na casa de Nelas, a campainha do recreio a meio de uma frase do professor de Matemática, a primeira vez que dancei de cara encostada com uma menina de treze anos também, o palhaço que me apertou a mão no circo, a tia Madalena para mim Estou aqui filho comigo com a tuberculose, o raio verde no Caramulo, agrafar mais, carimbar mais, vestir a camisola do Benfica aos quinze anos no primeiro treino, as Variações Goldberg, chegar da mata em Angola, os primeiros passos da minha filha Zézinha, eu a ensinar a Isabel a ler, o meu primo António a explicar-me Se a mãe sêsse o pai puzia gravata, um abraço do meu tio João Maria, o meu pai a deixar--me ganhar-lhe uma corrida, o meu irmão Pedro a contar Já vou no Pardal de regresso de uma aula de Catequese sobre o Espírito Santo, o primo Alfredo que me levantava acima da sua cabeça e eu maior do que toda a família, a minha mãe perfumada com Chanel número cinco, a Gija a coçar-me as costas antes de me vestir o pijama, a professora de Português, no primeiro ano do liceu, a apontar-me à turma Este menino vai ser um grande escritor e eu feliz, a primeira vez que li A Ruiva de Fialho de Almeida, o sabor da minha boca depois de um rebuçado de hortelã pimenta, a cor do mar da Praia das Maçãs às seis da tarde, receber uma carta de Céline quando lhe escrevi aos quinze anos, o dia em que o Cifra me veio dizer que tinha uma filha e fui chorar de felicidade e raiva para o arame farpado, os meus pais terem-me encontrado quando me perdi em Veneza aos sete anos junto a um dos leões de pedra na Praça de São Marcos, o meu avô a murmurar Meu netinho acariciando-me o pescoço, beber água da bilha, o primeiro dente de leite que descobri de manhã na almofada, a esperança de voltar a ler As Aventuras De Dona Redonda E Da Sua Gente, a minha pilinha de repente grande e eu cheio de orgulho e vergonha, com a minha mãe a fingir que não via, o tio Joaquim a levar-me até aos Correios, na Beira Alta, no quadro da bicicleta, o palhaço pobre que me deu um passou bem no circo, comer cocada de Belém do Pará feita pela tia Isabel, eu em Paris à procura da cegonha que me tinha trazido dali para Lisboa sete anos antes: ainda não perdi a esperança de a encontrar e de certeza que ela se lembra de mim, acho eu. Ter feito chichi em Nova Iorque ao lado de Mickey Rooney. Cortar, mal acabe isto, todas as páginas do bloco pelo picotado. Acho que devo ter por aí uma dessas coisas de fazer buraquinhos: que mais pode um homem desejar?
António Lobo Antunes
(Crónica publicada na VISÃO 1289 de 16 de novembro)


Lola


Amigo





Amigo

O que é e para que serve um amigo?

Às vezes, as amizades inquebrantáveis vêm a revelar-se mais frágeis do que se poderia pensar, deixando a sensação de impotência, perplexidade e frustração.
A amizade é uma das vertentes mais importantes das relações interpessoais. Podemos dar-nos com muita gente no decurso da nossa vida profissional, de vizinhança, comercial ou em vários contextos, mas a amizade é diferente: obriga a um aprofundamento das relações, a um tempo de conhecimento e de aprendizagem, a uma exigência maior em rigor e qualidade, a critérios mais finos para “passar a malha”. De igual modo, força-nos a uma entrega e a um investimento muito maiores nas componentes do “dar” e do “receber”.
Os amigos representam, para as crianças (como para toda a gente, aliás), a segurança de que se é querido e que se tem, também, objetos e alvos para o amor. Os amigos obrigam a prescindir de parte da vertente egoísta da pessoa, a fazer sacrifícios e a partilhar e ter sentimentos “vivos”, como a alegria ou a tristeza, a realização e, quantas vezes também, a desilusão. Compartilhamos os sentimentos dos nossos amigos e sentimo-nos tristes quando eles estão tristes, e alegramo-nos com os seus sucessos. Este desenvolvimento de empatia é necessário para criar pessoas e cidadãos estáveis, altruístas e humanistas.
Ter amigos é ter também alguém com quem nos podemos realizar, através das vidas deles, enriquecendo-nos constantemente – ao vivo, e não nas inefáveis redes sociais.
Para a criança, um amigo é uma segurança, é um recurso para os momentos piores – verbalizar os problemas e “desabafar” são fatores protetores ao longo da vida, permitindo muitas vezes a resolução dos problemas. Para lá de serem, ainda, apoios nas brincadeiras, na descoberta e exploração do mundo e na vida relacional, os amigos também nos sabem dizer o que vai mal e está errado connosco – devem, aliás, ser os nossos mais “ferozes” críticos –, ajudando-nos a descobrir-nos a nós próprios, nas nossas potencialidades, mas também nas nossas limitações. Ter amigos é uma coisa que deverá perdurar pela vida toda e mais vale poucos e bons do que muitos e assim-assim ou do que milhares de pseudoamigos no Facebook, Instagram ou WhatsApp.
Quando a amizade mais sólida é quebrada…
Às vezes, as amizades inquebrantáveis vêm a revelar-se mais frágeis do que se poderia pensar, deixando a sensação de impotência, perplexidade e frustração. A tendência natural será culpar o outro, e descobrirmos que, afinal, nos enganámos acerca daquela pessoa. Mas será assim tão simples? Duvido que, na maioria das vezes, o seja. Assim, é essencial desenvolver um processo mental de reflexão, a frio, para procurar ver porque é que isso aconteceu. Que motivos levaram um amigo a negar (provisória ou definitivamente) uma amizade? Teria sido um excesso de expetativas, nunca realizáveis? Teria sido uma ilusão que, mais tarde ou mais cedo, acabaria por revelar a evidência? Terá sido apenas um abanão que está a ser, por motivos intrínsecos ou exteriores, maximizado e exagerado? Será que a “Dona Emoção” está a asfixiar completamente a “Dona Razão”? Seja como for, compete aos pais ajudar a criança a decantar o problema, analisando os vários comportamentos e tentando ver o que correu mal e se isso é ainda reversível. Se a criança fez algo de errado – mesmo que, a princípio, lhe seja sempre muito difícil assumir –, deverá ter consciência disso e pedir desculpa aos amigos. Estes, se forem verdadeiros amigos, desculparão e perdoarão (o que são coisas diferentes, note-se!).
Se a resolução da questão for impossível, vale a pena ajudar a criança a aprender os ensinamentos desse episódio, sem minimizar o sofrimento (porque foi uma perda importante e tem de ser sentida), mas de modo a que não perdure – novas amizades virão, e dessa que acabou há que retirar todos os ensinamentos, designadamente o que esses amigos nos ajudaram a melhorar o nosso eu.
Amizades duradoiras?
Na infância há amizades muito fortes, mas que têm tempo limitado e que acabam, por exemplo, de um ano letivo para o outro, mesmo que, passados anos e anos, se ache graça a revê-las, porque há sentimentos de pertença e uma série de códigos, histórias e “estórias” em comum.
Todavia, uma amizade não se força: desen-volve-se, vive-se, aceita-se, sofre-se com ela, partilham-se momentos bons e outros menos bons, e não deve ser obrigatória. Se não toleramos certas coisas a “amigos” é porque, provavelmente, não serão tão amigos como isso. A verdadeira amizade é um relacionamento de verdade, partilha, respeito e aceitação. Os nossos amigos são como são, e tentarmos constantemente mudá-los para serem da maneira que nos convém mais é não ter a noção da autonomia e do respeito que a amizade deve manter – e da identidade individual que as pessoas devem manter, seja numa amizade, seja numa relação de tipo conjugal, por exemplo. Se a amizade resiste à diferença, então as pessoas nela incluídas são mesmo amigas. Talvez por isso tenhamos poucos amigos a sério. Outra coisa são conhecimentos, “amigalhaços”, colegas…
Como poderão os pais intervir bem?
Os pais não devem criticar demasiado os amigos nem os grupos de pertença, embora possam analisar com os filhos algumas atitudes de algumas pessoas, e as dos filhos com essas pessoas. A amizade tem de ser compreendida no seu contexto e é um misto de lucidez e de emoção. Não podemos deixar que a lucidez nos dê demasiada racionalidade e intolerância, mas também há que sermos objetivos, até para ajudar os amigos quando temos de os criticar ou admoestar. Os pais podem ser solidários e interessados nos amigos dos filhos, mas têm de deixar uma reserva de intimidade a estes, porque não é necessário expor tudo na “praça pública”.
Os amigos são como nós próprios – é o que nos faz viver grandes entusiasmos e grandes deceções, alegrias e tristezas. Há quem prefira nunca se expor ou dar, com receio de poder vir a sofrer. Essas pessoas poderão conseguir esse registo, mas perderão também grandes emoções e paixões. O balancear do pêndulo é uma vertente da vida, que há que viver plenamente para nos sentirmos cada vez melhores e cada vez mais aperfeiçoados, tolerantes, humanos e completos.
P. S. Nas muitas aldeias periféricas ao local onde passei férias, havia festa quase todos os dias. Os foguetes lá estavam, diariamente, a par da música. O meu cão ficou a pensar se não haveria um agente da autoridade nesses bailaricos? É proibido lançar artefactos pirotécnicos neste agosto… e os guardas presentes nessas festas? Não intervêm? Ou só intervirão quando a aldeia estiver a arder?
31 AGOSTO, 2017 - JORNAL I

Crónica do Pediatra Mário Cordeiro


  Lola

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Colegial





Colegial


Em cima da minha mesa,
Da minha mesa de estudo,

Mesa da minha tristeza
Em que, de noite e de dia,
Rasgo as folhas, leio tudo
Destes livros em que estudo,
E me estudo
(Eu já me estudo...)
E me estudo,
A mim,
Também,
Em cima da minha mesa,
Tenho o teu retrato, Mãe!


À cabeceira do leito,
Dentro dum lindo caixilho,
Tenho uma Nossa Senhora
Que venero a toda a hora...
Ai minha Nossa Senhora
Que se parece contigo,
E que tem, ao peito,
Um filho
(O que ainda é mais estranho)
Que se parece comigo,
Num retratinho,
Que tenho,
De menino pequenino...!

No fundo da minha mala,
Mesmo lá no fundo a um canto,
Não lhes vá tocar alguém,
(Quem as lesse, o que entendia?
Só riria
Do que nos comove a nós...)
Já tenho três maços, Mãe,
Das cartas que tu me escreves
Desde que saí de casa...
Três maços -- e nada leves! --
Atados com um retrós...

Se não fora eu ter-te assim,
A toda a hora,
Sempre à beirinha de mim,
(Sei agora
Que isto de a gente ser grande
Não é como se nos pinta...)
Mãe!, já teria morrido,
Ou já teria fugido,
Ou já teria bebido
Algum tinteiro de tinta! 

José Régio,.
"As Encruzilhadas de Deus"



                                         Lola

terça-feira, 14 de novembro de 2017

Devia ser...


Devia ser... 

 «Devia ser proibido casar com o primeiro namorado»
Andamos stressados, resignados, desligados do amor, quando na verdade não há nada na vida por que valha mais a pena lutar, avisa o psicólogo clínico Eduardo Sá. A pensar em todos nós escreveu «Quem Nunca Morreu de Amor», lançado esta quinta-feira em Lisboa. Os medos são muitos, sim. Mas a esperança no amor tem de ser mais forte.

Entrevista de Ana Pago
O que é isto de se morrer de amor?
É algo que já aconteceu a todas as pessoas que amam, e eu acho isso bonito. Significa que vivem as relações com o coração desabotoado – coisa que não acontece com toda a gente, e seguramente não todos os dias. Por outro lado, tem implícita a noção de que precisamos intensamente de alguém que traga contraditório à nossa vida para termos um sentido para crescer. Portanto, quando alguém se separa de nós, mesmo que o faça em português suave dizendo «Vamos dar um tempo», é claro que não ficamos só de coração partido. Morremos um bocadinho.

E não é uma catástrofe, isso?

Antes pelo contrário! Dói loucamente, a ponto de por vezes pensarmos em morrer no sentido mais literal da palavra. Mas depois vamos buscar vários sentidos para recriar esse amor que perdemos e, a dado momento, damos connosco à procura de outras pessoas que tragam sentido à nossa vida. Mesmo que o façamos dizendo aquilo que toda a gente saudável diz: «Depois de um amor assim, nunca mais na vida vou querer amar ninguém.»


«Costumo dizer que devia ser proibido casar com o primeiro namorado, na esperança de que isso possa fazer lei.»
É possível viver-se uma vida inteira sem termos morrido de amor pelo menos uma vez?
Eu desejaria que não. Acho absolutamente comovente amar alguém para sempre, mas tem tanto de comovente como de difícil. Costumo dizer que devia ser proibido casar com o primeiro namorado, na esperança de que isso possa fazer lei. E sim, devia ser recomendável morrer as vezes indispensáveis por amor até encontrarmos a pessoa que faça sentido à nossa vida. Sobretudo isso. É algo que nos torna humildes.

Quer dizer então que existem mesmo amores para toda a vida?
Sim, existem. Embora sejam raríssimos porque as pessoas, muitas vezes, desmazelam as relações amorosas e aquilo transforma-se com alguma facilidade numa relação fraterna, o que não é a mesma coisa. Em todo o caso, há ligações absolutamente mágicas. Relações nas quais os casais, em vez de envelhecerem para o amor, renascem permanentemente alimentados por ele.

Na maioria dos casos, somos muito apressados e muito preguiçosos. E é tão, tão difícil encontrar a pessoa «certa» que partimos do pressuposto de que se ela não nos cai no colo, no caminho de casa para o emprego, então é porque não existe. Às vezes, quando interpelo as pessoas, elas reagem de forma um bocado magoada e respondem: «Ah, agora quer que eu faça de Carochinha, não?» Claro que não quero que ninguém vá para a janela perguntar a todos os estranhos se querem casar com elas, por favor!

Sucede que, à medida que crescemos, vamos desertificando as nossas relações…
A começar pelas relações de amizade, sim. Os grupos pelos quais circulamos tornam-se menores, mais fechados a novas pessoas, e no meio de uma desertificação tão grande é natural que nos cruzemos com menos gente que nos obrigue a perguntar até que ponto a relação que eu tenho faz sentido, por comparação com aquela outra pessoa. Acho que ainda falamos muito pouco do amor. Falamos mais facilmente de sexualidade do que de amor. Na escola fala-se mais da educação para a sexualidade do que para o amor.

Talvez por se pensar que já estamos todos devidamente esclarecidos em relação ao amor?

Ou bem servidos, o que é mentira. O que vemos depois é que a esmagadora maioria dos casais é tão infeliz nas suas relações amorosas, tão resignada diante dessa infelicidade. E resignarmo-nos face à infelicidade é o contrário de se morrer de amor. É isso que eu acho que as pessoas não percebem e tenho pena que assim seja.


«A versão que se dá aos adolescentes da educação para o amor mais parece Educação Tecnológica parte dois.»
É fundamental educar para os afetos?
Precisamos de falar do amor e, sobretudo nas escolas, é vital explicar que nenhum amor dura para sempre se não for bem cuidado. Que mais importante do que casar é namorar, porque quando namoramos já casamos um bocadinho. Que nas relações amorosas nem todos acertamos à primeira, à segunda ou à terceira. A versão que se dá aos adolescentes da educação para o amor mais parece Educação Tecnológica ou Educação Moral e Religiosa parte dois. Isto, em vez daquilo que é estrutural e nos une: como é que eu posso ter a certeza de que a pessoa por quem estou perdidamente apaixonado gosta de mim?

Mas isso também porque o amor não é tangível. Cada um sente-o de maneira diferente…
Mesmo assim, não se fala dele. É quase um interdito, um tabu. Portanto sim, acho que a escola é um laboratório de liberdades tão mágico em tantos aspetos, nomeadamente no de pôr as pessoas a conversar e a pensar, a escutarem-se umas às outras, que se se pudesse trazer para dentro dela uma conversa séria sobre o amor… meu Deus, seria incrível. E nós temos verdadeiramente alguns professores do outro mundo, ao nível da confiança que os alunos depositam neles. Capazes de nos fazerem amar a vida.
Como é que, em nome do amor, há quem bata, maltrate e violente alguém que diz amar acima de tudo?

Não é amor, não pode ser. Só por aqui já justifica falar-se dele para se acabar com um certo discurso obscurantista. O amor não é o encontro com uma alma gémea, porque quando procuramos uma alma gémea estamos à procura de um reflexo nosso, nunca do amor. Acontece com muita gente: tentam encontrar alguém que idealizaram de todas as formas ao seu alcance sem que esse outro possa, seguramente, trazer diferença e crescimento ao seu mundo. São essas pessoas que não conseguem morrer por amor. A maldade é o que nos permite distinguir uma relação amorosa de outra coisa a que, de forma delirante e doentia, chamamos amor.


«Entre estarmos mal acompanhados ou sozinhos, preferimos a companhia, mesmo que nos adormeça para a vida.»
Falava ainda agora de almas gémeas: podem ser consideradas o expoente máximo do amor, em termos de ideal? Ou esta é uma visão redutora por pressupor que não somos completos à partida?
E não somos. Precisamos sempre de outras pessoas nas nossas vidas como contraditório para o exercício da justiça e para nos conhecermos. Quanto mais os outros são diferentes de nós, mais temos os apelos e as interpelações que nos obrigam a perceber quem somos. O poeta brasileiro Vinicius de Moraes dizia que é impossível ser feliz sozinho e eu concordo. Muitas vezes, quando temos essa ilusão ou consumimos aqueles slogans inquietantes que nos perguntam quem gostará de nós se nós próprios não gostarmos, é como se disséssemos aos outros que são adereços na nossa vida…

E não a porta indispensável que nos abre para saber quem somos…
E para nos conhecermos mais e melhor, sem dúvida. No limite, conhecer é amar, e vice-versa. Tenho pena que muitas vezes isso não seja dito de forma clara, porque acho que nos perderíamos todos menos com as coisas supérfluas do dia-a-dia. O que é mais bonito é que às vezes atravessam-se pessoas na nossa vida que acreditam mais naquilo que somos do que nós mesmos. E quando acreditam, levam-nos a tentar perceber em que ponto do caminho é que nos desencontrámos de nós, e a querermos voltar a ser quem supúnhamos que éramos mas, por qualquer motivo, deixámos de ser.

Também é por amor que tendemos a insistir até à última em relações condenadas?

Não, muitas vezes é por vaidade: como vou assumir um falhanço? Ou por medo: entre estar mal acompanhado ou sozinho, prefiro a companhia, mesmo que ela me adormeça para a vida. É como se o outro nos fosse convertendo na sombra do que somos e não no que somos, de facto – o contrário de termos alguém que se propõe conhecer-nos. E isso é muito inquietante porque, de repente, vamos perdendo em suaves prestações o respeito por nós. Acumulamos essa bruma e desistimos de quem somos, das nossas convicções, até morrermos para a vida. O que, volto a dizer, é diferente de morrer de amor.

Eduardo Sá


Quando começa um divórcio?
Quando não namoramos todos os dias. É facílimo divorciarmo-nos: basta termos muitos compromissos profissionais, muitas preocupações a esse nível, até filhos. Ao contrário do que eles e nós quereríamos, são os filhos quem melhor divorcia os pais, porque depois passamos a vida a tapar a cabeça e a destapar os pés, sempre a correr atrás do prejuízo. Temos a ideia de que existem relações seguras, em relação às quais podemos descontrair, e sem dar conta chegamos ao patamar em que falamos numa linguagem encriptada.

Nós ficamos sossegados, a achar que dissemos o que estávamos a sentir…

… Mas nem paramos cinco minutos para perceber se o outro entendeu o que queríamos dizer. Depois chega uma altura em que um amigo nos pergunta porque não dissemos o que sentíamos e nós desabafamos: «Porque não estou para me chatear.» Começamos a divorciar-nos quando já não estamos para nos chatear. Quando chegamos à célebre frase que já todos dissemos e todos escutámos: «Não lhe disse porque não vale a pena. Ele não ia perceber.»


«Brinco muitas vezes com o Dia dos Namorados: porque havemos de ter só um dia no ano para namorar?»
Sendo assim, haverá muita gente divorciada por dentro, mesmo que esteja casada por fora.
Por isso é que brinco muitas vezes com o Dia dos Namorados: porque havemos de ter só um dia no ano para namorar? Por outro lado também é inquietante ver duas pessoas, que tecnicamente são namorados, sentadas a uma mesa em que uma fala com o bife e outra com as batatas fritas, com uma vela no meio, cada qual a consultar o seu Facebook sem trocar palavra. Vivemos num mundo que quer ser tecnicamente irrepreensível quando, no amor, devíamos ser apaixonadamente repreensíveis. Porque isso acontece se temos alguém ao nosso lado que nos diz que, por mais tolos que sejamos, ele não vai desistir de nós.

Sofre-se mais por amor quando temos 15 anos e não sabemos nada da vida? Ou quando já passámos por tantos embates que custa horrores a suportar mais um?
Esqueça, um amor maduro é incomparavelmente mais bonito – e mais difícil. Tenho o maior respeito pelos adolescentes, o maior. Mas quanto mais velhos somos, também maiores se tornam as probabilidades de encontrarmos a pessoa da nossa vida ou, pelo contrário, de ficarmos sozinhos para sempre. Temos uma sensibilidade tão mais educada, damos tanta importância a pequenos pormenores, que depois não se chega lá com marketing e publicidade enganosa. Apenas com transparência.

Em que é que o amor de mãe difere de todos os outros amores?
É mágico. Imagine uma mulher no limite da exaustão, cheia de preocupações, com uma atividade profissional que valha-nos Deus e uma família de origem em que a mãe e a sogra disputam entre si para ver quem sabe mais de bebés, em vez de darem colo à mãe – ninguém dá colo às mães. Se alguém soprar, aquela mãe escangalha-se. E então o seu filho chora, sorri, aninha-se-lhe nos braços, e toda ela se ilumina. É amor de mãe. Mas atenção: há amores maduros que podem ser muito parecidos com isto, daí serem tão raros. E tão absolutamente arrepiantes quando acontecem.

O romantismo está em vias de extinção?
Não, nunca, embora eu tenha medo de que as pessoas o considerem jurássico. É verdade que todos os amores são ridículos: dizemos coisas que em condições normais não diríamos sob pena de nos julgarem loucos; fazemos patetices que são uma ternura. Ser romântico é uma forma de sermos especialmente amáveis para alguém, que nos abre para sermos amados e nos faz tocar a alma do outro. Devíamos dizer aos adolescentes – a toda a gente, já agora – que não só não está em vias de extinção como não é vergonha.

Temos medo de amar, todos nós?
Todos, todos, todos. Mas como poderemos crescer sem dor?


É por isso que vemos tanta gente infeliz e em relações frustradas à nossa volta?
Amar dá muito trabalho, exige tempo, dói. Porém, acho que pecamos sobretudo por não conseguirmos fechar os olhos nos braços da outra pessoa, como faz um bebé no colo da mãe. Nunca vamos amar enquanto não formos capazes de fechar os olhos nos braços de alguém, porque isso é outra forma de dizermos «Sente. Olha para mim, sente-me em ti, pensa por nós.» E não há nada que valha mais a pena.

Eduardo Sá
In Noticias Magazine
13 de novembro de 2017



Lola

domingo, 12 de novembro de 2017

A arte de ser feliz


A arte de ser feliz

Houve um tempo em que a minha janela se abria para um chalé. Na ponta do chalé brilhava um grande ovo de louça azul. Nesse ovo costumava pousar um pombo branco. Ora, nos dias límpidos, quando o céu ficava da mesma cor do ovo de louça, o pombo parecia pousado no ar. Eu era criança, achava essa ilusão maravilhosa e sentia-me completamente feliz.
Houve um tempo em que a minha janela dava para um canal. No canal oscilava um barco. Um barco carregado de flores. Para onde iam aquelas flores? Quem as comprava? Em que jarra, em que sala, diante de quem brilhariam, na sua breve existência? E que mãos as tinham criado? E que pessoas iam sorrir de alegria ao recebê-las? Eu não era mais criança, porém a minha alma ficava completamente feliz.
Houve um tempo em que minha janela se abria para um terreiro, onde uma vasta mangueira alargava sua copa redonda. À sombra da árvore, numa esteira, passava quase todo o dia sentada uma mulher, cercada de crianças. E contava histórias. Eu não podia ouvir, da altura da janela; e mesmo que a ouvisse, não a entenderia, porque isso foi muito longe, num idioma difícil. Mas as crianças tinham tal expressão no rosto, a às vezes faziam com as mãos arabescos tão compreensíveis, que eu participava do auditório, imaginava os assuntos e suas peripécias e me sentia completamente feliz.
Houve um tempo em que a minha janela se abria sobre uma cidade que parecia feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre homem com um balde e em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz.
Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.

Cecília Meireles, no livro “Escolha seu sonho”

Lola

sábado, 11 de novembro de 2017

Primeiro levaram os negros



Primeiro levaram os negros


Primeiro levaram os negros

Mas não me importei com isso
Eu não era negro
Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei
Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.
Bertold Brecht (1898-1956)




                                            Lola

Conto de Natal


Diana - 1984/2007

Um Natal de nome DIANA
2016

-"Mãe, vem buscar-me à estação de Ovar?"
Ainda ecoam na minha memoria as palavras da minha filha num dos últimos dias de Novembro, antecipando um fim de semana que iria ser (porque não?) como tantos outros de alegre e tranquila convivência entre nós e os animais que, surpreendentemente, a esperavam cada sexta feira que regressava da Universidade de Aveiro!
 -"Mãe, vem buscar-me a casa em Aveiro?"
Chove torrencialmente e  ela justifica a impossibilidade de chegar à estação e pede um pouco mais! Sabe que desde há muitos anos a mãe está sempre atenta, sempre disponível para os filhos, nomeadamente para ela que tem um olhar doce de menina primeira na minha vida de maternidade!
É Novembro! Estamos quase no final do mês e é natural o nosso cansaço e a vivência brilhante do Natal que se aproxima e dos mimos que, deliciosamente, se trocam entre gestos de aparente (des)agrado e de muita, muita satisfação e doce gratidão! Curiosamente o Natal foi sempre passado em família, na casa dos avos paternos... que isto de festas no inverno frio sabe bem o aconchego existencial da experiência dos mais velhos!
E assim se passava uma noite sempre adoçada pelos bolos que compunham a mesa ao mesmo tempo que os mais pequenos não viam a hora da distribuição das prendas...pois o Pai Natal mais que povoar o imaginário dos miúdos era agora a figura ternurenta e bochechuda que em porcelana ou barro tosco enfeitava cantos e recantos da sala, coloridamente, decorada pela avô!
Aquele era, porem, um Natal diferente...muito, muito diferente!
Eu sabia desde que os médicos, um mês antes, de forma humana mas sem rodeios e, após um exame localizado, me disseram, nos corredores do Hospital de Santo António:
- "E muito grave..só um milagre!"
- "Doutor: quanto tempo?, perguntei eu na minha solidão anestesiada pelo entardecer sombrio de uma relação que, sendo incondicional é, acima de tudo, inquebrantável!
 - "Três a seis meses!"
- "Vai sofrer?"
- Não...adormece!"
De modo inexplicável fiquei serenamente repousada num momento perfurante!
Porquê? A partir desse momento iniciei a abordagem do tempo de forma inversa: já não olhava os dias de uma forma cronologicamente neutra ...mas sim de um colorido esperançado: cada dia que passava era mais um que vivia com a Diana e isto se a linguagem não consegue expressar na sua completude, o eu tornado mãe sentia-o enternecidamente!

Tivera-a durante vinte e dois anos comigo! Era muito feliz na nossa relação de muito mais que amigas mutuamente interessadas e interessantes e agora a vida tratava amargamente de castrar a minha existência maternal com a proximidade de uma separação que a ciência me explicou ser impossível evitar com sucesso!
O dia quente anoitece nos braços de uma festa de consoada em casa dos avos paternos! Com esmerado cuidado ajudo a Diana a entrar no carro para todos chegarmos à ceia que decorre normalmente a não ser os mais pequenos que fazem um bocadito de barulho mas que ela, apesar de exausta e sem grandes forças físicas, sorri ...porque afinal são miúdos e ela compreende muito bem as suas ansiedades!
 Regressamos!
Já em casa ela desabafou: "este ano quase todos me deram pijamas...e temos de ir ao Porto comprar a tua prenda!" A minha filha, nunca se esquecia de trazer uma prendinha que fosse no aniversario e natal para cada um de nos! Sorria sempre que nos presenteava com algo que escolhia de acordo com a gestão do dinheiro que mensalmente lhe depositava na conta! Simples no vestir, gostava de roupa preta que combinava com um ou outro agasalho rosa claro ou azul bebe como os seus olhos expressivos e transparentes!
O Natal que foi o ultimo dela e meu .... há muito que se esvaziou!
A 12 de Janeiro de 2007 eu senti no intimo do meu ser a amargura gelada de ver partir um filho! Eu que, professora de Filosofia, tantas e tantas vezes tinha questionado com os meus mochinhos (alunos) a inevitabilidade da morte, a vida como tempo e espaço entre o nascer e o perecer, o carácter pessoal e intransmissível do morrer e o facto de nunca se morrer na primeira pessoa... pois morremos sempre para os outros e não para nos! Agora era eu a necessitar, mais do que ninguém, de olhar à volta e gritar: PORQUÊ?
Não sei... no dia da despedida não despreguei o olhar ao longo do seu traje académico que a vestiu e do qual ela tanto gostava! Estava uma tarde de sol brilhante e eu ia passando pelo meu pensamento alguns dos bons momentos que passamos juntas ou mesmo quando, no escritório, estudavamos as "nossas" matérias e ela me falava do ADN da minhoca o que eu achava estupidamente engraçado ...como é que um bichito como a minhoca tinha a cadeia de ADN de si tão complexa!
Dou-lhe a mão na igreja! Não me separo nem um minuto da sua carita que coloco entre as minhas mãos! Na entrada uma voz de uma pureza cristalina cantou, a meu pedido "Avé Maria" de Shubert,  já que um dia tínhamos combinado que seria a musica de entrada no momento do seu casamento! Não pode ser...foi neste dia!
Na majestosa igreja que nos acolhe para  a acarinhar pela ultima vez e,  no único momento que me afasto um pouquinho do seu rosto, passeio o olhar pelo lado esquerdo da ala lateral e... demoro-me um instante num anjo moreno vestido de azul, aos quadradinhos... que, por certo ela me enviou para me ajudar a viver a SAUDADE que doravante me irá acompanhar!
Nesse e "No dia seguinte ninguém morreu" como inicia José Saramago a sua obra "As intermitências da Morte" que, curiosamente, a Diana me oferecera no Natal anterior e que continua na mesinha de cabeceira, juntinho de mim ...porque ainda não passei da primeira pagina! E não será, certamente, por falta de tempo!
A Florista disse-me, mais tarde,  que nesse dia fechou à hora de almoço...não tinha mais flores! Também eu não tinha nada...nem lágrimas, nem palavras, nem sequer lamentos!

Hoje estou serenamente tranquila! Se fisicamente estamos, forçadamente, separadas, tenho de confessar que humanamente me sinto feliz! Porquê? Porque esteve envolvida numa repousante viagem de partida e, sobretudo, porque sinto que é preferível o caminho de forma digna ao de tê-la sofrendo egoisticamente aqui!
A vida e o seu sentido muda a nossa mundividência!  Há que continuar lutando por aqueles que ficam junto de nos! Não sei bem porquê,  mas acredito que um dia nos encontraremos de novo, quem sabe..numa outra dimensão e ai sim vai haver Natal de encontro...e beijinhos de aconchego nesta dor que não tendo nome (porque não é orfandade),  não deixa de ser, irremediavelmente, a  perda maior!
Dez anos de SAUDADE!
Eu continuo aqui, de pé, integra e inteira sorrindo para as estrelas e fruindo aquilo que o mundo tem de belo...e, sobretudo, de sublime! Em dias de  agradável amanhecer gosto de me envolver com o MAR num abraço de corpo inteiro que há muito, eu e ELE sabemos de cor!
Não provei o sabor da revolta nem a cedência ao conformismo ininteligível! Os alunos e a escola continuam a ser um espaço e tempo de afectos que não se podem reduzir à época do Natal! O Outro deve e tem de ser  a nossa prioridade e o CUIDADO um imperativo do ser humano em busca da dignidade da PESSOA que renasce na vivência saudável e continuada dos valores éticos! E, por vezes, dou comigo a pensar...
Haverá Natal no céu?
Lola - Mãe



Nota Biográfica

Rosa Sousa ou LOLA como é tratada pelos familiares e alunos, nasceu em 1957, no Porto. Licenciada em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto desde Julho de 1981, é mestre em Filosofia da Educação pela mesma universidade desde Abril de 2004. Professora de Filosofia na Escola Secundária de Arouca é autora de dois blogues: 
" Lola e a Filosofia", dirigido ao apoio dos alunos e "O Mar e a Filosofia" onde revela um carácter mais pessoal,  intimista e apaixonante. Neste ano letivo está a desenvolver um projeto de “Filosofia para crianças” com alunos dos 1° ano, uma experiência que pretende  continuar no sentido de contribuir para o desenvolvimento de um pensamento livre e autónomo! Curiosa, exigente, tolerante, atenta, interessada, cuidada, inconformada, comprometida e empenhada adora ler, escrever, viajar, conversar, ouvir musica...e demora-se com a obra de Kant e com o colorido silêncio do MAR! O Abraço é a manifestação de afecto que mais a encanta e no qual gostaria de parar o tempo!



                                            Lola