quarta-feira, 21 de outubro de 2020

Obrigado, Samuel Paty!




Obrigado, Samuel Paty!


"Samuel Paty tornou-se sexta-feira o rosto da República, da nossa vontade de quebrar terroristas, de reduzir os islâmicos, de viver como uma comunidade de cidadãos livres no nosso país. O rosto da nossa determinação em entender, aprender, continuar ensinando, ser livres.

Porque nós vamos continuar, Professor.
Defenderemos a liberdade que você ensina tão bem e vamos usar o laicismo alto.
Nós não vamos desistir de caricaturas, desenhos, mesmo que outros recuem.
Vamos oferecer todas as chances que a República deve a toda a sua juventude sem qualquer discriminação.
Vamos continuar, Professor.
Com todos os professores e professores da França, vamos ensinar história, suas glórias e suas vicissitudes. Vamos mostrar literatura, música, todas as obras da alma e da mente.





Amamos com toda a nossa força o debate, os argumentos razoáveis, as persuasões amáveis. Nós amamos a ciência e suas controvérsias.
Tal como você, nós cultivamos tolerância. Tal como você, nós vamos tentar entender, sem parar. E entender ainda mais isso que alguém quereria afastar de nós.

Aprenderemos o humor, a distância, recordaremos que nossas liberdades só se mantêm no fim do ódio e da violência. Pelo respeito pelo outro.
Vamos continuar, Professor.
E ao longo da vida, as centenas de jovens que você treinou irão exercitar essa mente crítica que você lhes ensinou.




Talvez alguns deles também se tornem professores. Então eles formarão jovens cidadãos. Eles vão fazer com que a República ame. Eles farão entender a nossa nação, os nossos valores, a nossa Europa, numa cadeia dos tempos que não vai parar.
Vamos continuar, sim, essa luta pela liberdade e pela razão que você é agora o rosto.
Porque nós lhe devemos isso.
Porque nós devemos a nós mesmos.
Porque em França, professor, as luzes nunca se apagam.
Viva a República, viva a França".

Emanuel Macron
Presidente de França





O contexto

O professor Samuel Paty, um pai de família de 47 anos, pagou com a vida a iniciativa de mostrar caricaturas do profeta Maomé numa aula sobre a liberdade de expressão. Pouco depois de deixar a escola onde trabalhava na pequena cidade de Conflans-Saint-Honorine, por volta das 17h desta sexta-feira (16), o educador foi decapitado por um terrorista, um jovem de 18 anos de origem chechena que ficou indignado com a atitude da vítima em sala de aula.

Neste sábado (17), alunos, pais, colegas e amigos de Paty o descrevem como um homem gentil, apaixonado pela profissão. O crime chocou o país – o Palácio do Eliseu anunciou a realização de uma homenagem nacional ao professor, nos próximos dias. Centenas de pessoas dirigiram-se em frente à escola e depositaram flores no local.

“Quando li ‘professor, [escola] Bois d'Aulne e decapitação’, pensei na hora: ‘é o senhor Paty!’”, disse o ex-aluno Martial, 16 anos, à AFP.

A escola fica em um bairro industrial da cidade, de 35 mil habitantes e a cerca de 50 quilômetros de Paris. “Ele se envolvia nas aulas, queria realmente nos ensinar as coisas. De tempos em tempos, ele promovia debates, a gente conversava”, relata o garoto.

“Estou destruído. Samuel Paty foi meu colega de formatura. Era um estudante brilhante, um superprofessor, um homem de diálogo”, disse, no Twitter, um ex-colega da vítima. “Citarei o teu nome e o teu exemplo, camarada, a todos que quererão ainda exercer essa linda profissão”, complementou.


De porte pequeno, óculos e discreto, o professor era casado e tinha filhos. Na semana passada, como já havia feito em outras ocasiões nos últimos anos, ele levou à sala de aula uma caricatura de Maomé, publicada no jornal Charlie Hebdo, para explicar aos alunos sobre aquela que é um dos pilares da República francesa, a liberdade de expressão. A classe tinha em média 13 anos e cursava o equivalente ao oitavo ano.

Desta vez, porém, a iniciativa não foi bem recebida por todos. Os alunos relatam que o professor perguntou quem era muçulmano na sala e ofereceu a eles a possibilidade de se retirar ou não olhar, se preferissem não visualizar o desenho. Alguns saíram; outros, não.

Nas horas e dias que se seguiram, o que ocorreu naquela aula foi o assunto na hora do recreio. Alguns pais foram além e levaram uma reclamação à associação de pais e alunos.

Pai de aluna trocou mensagens de texto e telefonemas com homicida de professor decapitado

Um deles publicou um vídeo indignado nas rede sociais, no qual chama Paty de “bandido”, incita outros pais a se mobilizarem contra a atitude do educador e divulga o nome da escola. Ele chegou a ir à polícia acompanhado da filha para denunciar o que considerou como um ato de islamofobia por parte do professor – que reagiu prestando queixa por difamação.

Desde então, Paty “andava desconfortável”, observa Myriam, aluna de 13 anos da escola. “Tinha alunos dizendo ‘ele é racista’. Outros qualificativos circularam, como ‘islamofóbico’”.

Paty “não fez isso para criar polêmica ou desrespeitar os pequenos, nem por discriminação”, alega Nordine Chaouadi, pai de outro adolescente de 13 anos que descreve professor como “um senhor supergentil”.

A polícia investiga qual o papel do vídeo no crime, já que o autor do ataque tinha 18 anos e não estudava no local. O autor, nascido em Moscou e com um visto de refugiado na França, obtido em março deste ano, foi morto pela polícia instantes depois do assassinato.

A classe política e educacional francesa amanhece estarrecida neste sábado (17), após a decapitação de um professor de 47 anos que exibiu caricaturas de Maomé durante uma aula sobre liberdade de expressão, nos arredores de Paris. O crime, tratado como terrorista islamita pelas autoridades francesas, ocorreu na tarde desta sexta-feira (16) em plena rua, a 300 metros da escola onde a vítima ensinava história e geografia.

A exibição das caricaturas durante a aula para alunos de 13 anos, na semana passada, havia causado indignação de alguns pais. Um deles chegou a tentar prestar queixa contra o professor e postou um vídeo no YouTube para denunciar a postura em classe. As imagens podem ter estimulado o agressor, que foi morto pela polícia logo depois de cometer o assassinato. 


Papel do professor é estimular a reflexão, diz educadora

“Dá muito medo, porque agora estamos todos estarrecidos, é um choque
profundo. O que se passou é extremamente violento”, disse à RFI Christine
Guimonnet, professora no colégio Pontoise e secretária-geral da Associação de
Professores de História e Geografia (APHG). “O que a gente ensina aos alunos é
para lhes dar as chaves: as chaves para a compreensão do mundo, da história, da
geografia. O ensino, num Estado democrático, tem como objetivo instruir os
eles religiosos ou não. Quando temos opiniões diferentes, a gente deve falar,
alunos, desenvolver neles o acesso ao conhecimento, à reflexão, à razão - sejam
trocar ideias, não se estapear nem matar alguém”, explica a professora.

“Nossos professores continuarão a despertar o espírito crítico dos cidadãos
da República, a emancipa-los de todos os totalitarismos e de todos os
sábado. O ministro da Educação, Jean-Michel Blanquer, garantiu que o Estado
obscurantismos”, declarou o primeiro-ministro francês, Jean Castex, neste
continuem a exercer a profissão, a mais essencial, que transmite aos nossos
francês “estará ao lado” dos professores para “protegê-los e permitir que
filhos o saber e os valores que são o nosso bem comum”.

RFI

Samuel Paty mostrou duas caricaturas de Maomé numa aula sobre liberdade de expressão. O seu assassino, de 18 anos, acabou morto pela polícia. Uma mesquita será encerrada e o professor será condecorado postumamente com a Legião de Honra. Macron anunciou a dissolução de uma organização islamita fundada por um dos detidos

As autoridades que investigam a morte do professor Samuel Paty, decapitado na sexta-feira perto do liceu onde lecionava nos arredores de Paris, descobriram várias mensagens de texto e chamadas telefónicas entre o pai de uma aluna e o assassino. A informação foi avançada esta terça-feira pela rádio francesa Europe 1, que cita fontes policiais.

O pai publicou o seu número de telefone no Facebook juntamente com um vídeo em que apelava ao despedimento de Paty depois de este ter mostrado duas caricaturas do profeta Maomé numa aula.

As autoridades anunciaram ainda o encerramento de uma conhecida mesquita na sequência do assassínio do professor. O ministro do Interior, Gérald Darmanin, esclareceu que a mesquita em Pantin será encerrada esta quarta-feira e permanecerá de portas fechadas durante seis meses.

A decisão foi tomada enquanto decorre uma investigação policial a redes suspeitas de promoverem crenças religiosas extremistas, propagarem o ódio e encorajarem a violência.

Os investigadores do caso acreditam que vários estudantes indicaram quem era o professor ao jiadista que o decapitou na sexta-feira ao lado da escola onde trabalhava. Os estudantes tê-lo-ão feito em troca de dinheiro.

Uma fonte próxima da investigação, citada pelo jornal “The Guardian”, revelou que a mesquita, que tem cerca de 1.500 fiéis, publicou um vídeo no Facebook sobre Paty dias antes de o professor de História e Geografia ter sido morto aos 47 anos. O vídeo criticava violentamente a decisão do professor de mostrar aos seus alunos duas caricaturas do profeta Maomé, juntamente com outras ilustrações, no âmbito de um debate sobre liberdade de expressão.

ALUNOS MUÇULMANOS FORAM AUTORIZADOS A SAIR DA SALA SE
SE SENTISSEM DESCONFORTÁVEIS

O professor deu a possibilidade aos alunos muçulmanos de abandonarem a sala de aula no caso de se sentirem desconfortáveis.

O ministro francês da Educação, Jean-Michel Blanquer, adiantou que, na homenagem nacional que será feita esta quarta-feira na Universidade Sorbonne, Paty será condecorado postumamente com a Legião de Honra, a mais alta distinção oficial do país. O professor será ainda nomeado membro da Ordem das Palmas Académicas (Ordre des Palmes Académiques), acrescentou o governante.

Em entrevista ao canal de televisão BFMTV, Blanquer esclareceu que “há elementos” que sugerem a possibilidade de o professor ter sido indicado por vários estudantes, sendo que quatro deles foram detidos. Um quinto aluno acabou por ser libertado sem acusações.

A provar-se verdade, o envolvimento dos alunos é “gravíssimo” e demonstra “a penetração entre os mais jovens de uma certa visão do mundo”, a do “islamismo fundamentalista”, através das redes sociais e de certas organizações, apontou o ministro.

ESTÁ EM CURSO UMA “CONTRAOFENSIVA DA REPÚBLICA”, DIZ
MINISTRO DA EDUCAÇÃO

O professor foi apunhalado e decapitado no exterior do liceu onde lecionava em Conflans-Sainte-Honorine, a cerca de 30 quilómetros da capital francesa. Abdouallakh Anzorov, o assassino de 18 anos de origem chechena, tinha estatuto de refugiado no país, à semelhança de outros membros da sua família. Anzorov acabou morto pela polícia.

Os primeiros elementos da investigação sugerem que foi criada uma polémica através de mensagens publicadas nas redes sociais por alguns pais de alunos da escola. Em particular, o pai de uma aluna publicou um vídeo acusatório e lançou uma campanha contra o professor, com a qual apelava à punição do docente.

A 2 de novembro, no regresso das férias escolares de outono, todas as escolas em França observarão um minuto de silêncio em memória de Paty e os alunos que não o respeitarem serão sancionados. Blanquer sublinhou que está em curso uma “contraofensiva da República” francesa.

Pelo menos 15 pessoas, incluindo os quatro estudantes, estão detidas e a ser interrogadas pelas autoridades antiterrorismo para tentar estabelecer um elo entre estes suspeitos e o homicida.

O homicídio ocorreu pelas 17h00 locais (16h00 em Lisboa) de sexta-feira, nas imediações do liceu de Bois d’Aulne.

MACRON ANUNCIA DISSOLUÇÃO DE ORGANIZAÇÃO ISLAMITA

Entretanto, o Presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou a dissolução do grupo Xeque Yassine, fundado por um dos detidos pelo atentado e conhecido pelas suas declarações extremistas. Durante uma breve intervenção, Macron avançou que o Conselho de Ministros de quarta-feira vai aprovar a medida.

O chefe de Estado acrescentou que as ações judiciais e das forças de segurança se vão intensificar contra associações e indivíduos que promovam um projeto integrista radical.

Está em curso uma estratégia, insistiu Macron, adiantando que os cidadãos têm de ser defendidos, incluindo os de religião muçulmana, que também devem ser defendidos do islamismo radical.

A organização Xeque Yassine foi fundada em 2004, como entidade a favor dos palestinianos e o seu nome invoca o fundador do Hamas, Ahmed Yassine, assassinado por Israel naquele ano. Mas a sua notoriedade atual em França resulta mais da sua retórica antissemita e islamita.

O seu fundador é Abdelhakim Sefrioui, um dos detidos pela decapitação de Paty. Sefrioui foi, com o pai de uma aluna, exigir à diretora da escola que despedisse o professor e divulgou um vídeo em que pedia represálias contra o docente, classificado como bandido.

Expresso

20 de Outubro de 2020


                                                 Lola