quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Chuva de Verão




Chuva de Verão

E toda a noite a chuva veio
E toda a noite não parou,
E toda a noite o meu anseio
No som da chuva triste e cheio
Sem repousar se demorou.



E toda a noite ouvi o vento
Por sobre a chuva irreal soprar
E toda a noite o pensamento
Não me deixou um só momento
Como uma maldição do ar.

E toda a noite não dormida
Ouvi bater meu coração
Na garganta da minha vida.


Fernando Pessoa.

                                            Lola

Diz-me





Diz-me



Diz-me por favor onde não estás
em qual lugar posso não te ver,
onde posso dormir sem te lembrar
e onde relembrar sem que me doa.


Diz-me por favor onde posso caminhar
sem encontrar as tuas pegadas,
onde posso correr sem que te veja
e onde descansar com a minha tristeza.

Diz-me por favor qual é o céu
que não tem o calor do teu olhar
e qual é o sol que tem luz apenas
e não a sensação de que me chamas.

Diz-me por favor qual é o lugar
em que não deixaste a tua presença.
Diz-me por favor onde no meu travesseiro
não tem escondida uma lembrança tua.

Diz-me por favor qual é a noite
em que não virás velar meus sonhos.
Que não posso viver porque te espero
e não posso morrer porque te amo.

Gustavo Alejandro Castiñeiras

 Nome original: Poema de un Recuerdo)


São tantas as saudades de ti, my dear!

                                              Lola



quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Tua Cantiga




Tua Cantiga


 
Quando te der saudade de mim
Quando tua garganta apertar
Basta dar um suspiro
Que eu vou ligeiro
Te consolar

Se o teu vigia se alvoroçar
E, estrada afora, te conduzir
Basta soprar meu nome
Com teu perfume
Pra me atrair

Se as tuas noites não têm mais fim
Se um desalmado te faz chorar
Deixa cair um lenço
Que eu te alcanço
Em qualquer lugar

Quando teu coração suplicar
Ou quando teu capricho exigir
Largo mulher e filhos
E de joelhos
Vou te seguir

Na nossa casa
Serás rainha
Serás cruel, talvez
Vais fazer manha
Me aperrear
E eu, sempre mais feliz

Silentemente
Vou te deitar
Na cama que arrumei
Pisando em plumas
Toda manhã
Eu te despertarei

Quando te der saudade de mim
Quando tua garganta apertar
Basta dar um suspiro
Que eu vou ligeiro
Te consolar

Se o teu vigia se alvoroçar
E, estrada afora, te conduzir
Basta soprar meu nome
Com teu perfume
Pra me atrair

Entre suspiros
Pode outro nome
Dos lábios te escapar
Terei ciúme
Até de mim
No espelho, a te abraçar

Mas teu amante
Sempre serei
Mais do que hoje sou
Ou estas rimas
Não escrevi
Nem ninguém nunca amou

Se as tuas noites não têm mais fim
Se um desalmado te faz chorar
Deixa cair um lenço
Que eu te alcanço
Em qualquer lugar

E quando o nosso tempo passar
Quando eu não estiver mais aqui
Lembra-te, minha nega
Desta cantiga
Que fiz pra ti

Chico Buarque




https://www.youtube.com/watch?v=dk8arhNQta0



Reflexões acerca da canção maldita...

Chico Buarque, o perigoso machista
Os estilhaços dessa literalidade idiota chegaram agora às canções do pobre Chico, antes amado por entender como nenhum outro a condição feminina. Se até ele é machista, nenhum homem está a salvo.

Francisco Buarque de Hollanda decidiu apresentar o seu próximo disco com o lançamento de um tema chamado Tua Cantiga. O que ele foi fazer. Tua Cantiga, história singela de um homem de família perdidamente apaixonado por outra mulher, tem lá pelo meio os seguintes versos: “Quando teu coração suplicar/ Ou quando teu capricho exigir/ Largo mulher e filhos e de joelhos vou te seguir.” Foi o que bastou para o artista que em tempos foi classificado como “unanimidade nacional” ser acusado de estar a promover em 2017 o velho machismo de 1977. Escreveu Luciano Trigo no Globo: “Chico parece preso a uma visão da mulher – e da relação homem-mulher – dos anos 70 do século passado (…), cujo romantismo se baseava na desigualdade e na assimetria de papéis entre homens e mulheres.”
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Parece que a mulher trabalhadora brasileira com menos de 30 anos já não vai em conversa de amores assolapados, e que proferir frases como “na nossa casa serás rainha” (também consta da letra) é uma ofensa para qualquer mulher devidamente empoderada. “Largar mulher e filhos? Que cafajestada é essa?”, pergunta Luciano Trigo. A produtora Flávia Azevedo, escrevendo no HuffPost Brasil, concorda: “Essa mulher que ele evoca, não sou eu. Nem a que somos nem a que queremos ser. Essa que precisa ser salva, que sonha com o reino do lar, essa que goza ao ouvir ‘largo mulher e filhos’.” A obsessão com a linguagem por parte da esquerda mais progressista está a ter esta consequência estranhíssima: torna o seu discurso muito próximo do da direita conservadora. Mesmo um defensor de Chico Buarque disse que Tua Cantiga era uma “canção sobre dois adúlteros”, expressão que já não ouvia desde os tempos em que o arcebispo de Braga tomava posições públicas sobre O Império dos Sentidos.
Chico Buarque já respondeu à polémica, com a inteligência e o humor que Deus lhe deu, reproduzindo no seu Facebook um diálogo que diz ter “entreouvido na fila de um supermercado”: “Será que é machismo um homem largar a família para ficar com a amante? Pelo contrário. Machismo é ficar com a família e a amante.” A piada é boa, mas não chega a ser verdadeira. Ficar com a família e a amante não é machismo, tal como ficar com a família e o amante não é feminismo – é apenas traição. E a traição, até há bem pouco tempo, era algo que somente dizia respeito aos envolvidos. Contudo, num mundo onde as palavras estão sob uma vigilância que já não se via desde os tempos da Inquisição, não só uma simples canção ficcional passa a ser um manifesto machista, como a argumentação alegadamente “feminista” e “empoderada” é ridiculamente parecida com a do Catecismo da Igreja Católica.
Os grupos oprimidos e seus defensores, SJW (Social Justice Warriors) para os amigos, estão diariamente a bombardear o muro que separa as palavras dos actos, fazendo equivaler uns e outros. Que isto seja típico de uma mentalidade totalitária parece não lhes passar pela cabecinha. Os estilhaços dessa literalidade idiota chegaram agora às canções do pobre Chico, antes amado por entender como nenhum outro a condição feminina. Se até ele é machista, nenhum homem está a salvo. Antigamente, eram só os cristãos que iam à missa pedir perdão por pensamentos, palavras, actos e omissões. Os novos sacerdotes do politicamente correcto não querem menos do que isso – exigem que nos ajoelhemos aos pés dos infinitos deuses dos SJW e peçamos perdão não só pelo que fizemos, mas também pelo que dissemos, pensámos e cantámos no duche.


In Observador
 joao miguel tavares
                                                                                                     22 de agosto de 2017, 6:06
Chico no país das caravanas
Chico Buarque tem em Caravanas mais uma prova do seu génio musical. O resto são cantigas.
Caravanas 

Chico Buarque, uma voz no mundo de Trump, dos refugiados e do terror universalizado 

Eis, finalmente, desvendado o novo disco (e 23.º) de Chico Buarque: Caravanas chega sexta-feira às lojas, físicas e virtuais, e nas suas nove canções mantém elevado o padrão a que o autor nos habituou. Deixando de lado as polémicas patetas (e falsamente morais) que rodearam Tua cantiga, lembrando as que no passado, com extrema ignorância, apontavam Mulheres de Atenas como sendo baseada em estereótipos machistas (!), Caravanas cruza os dois territórios onde Chico se aventurara nos discos anteriores: o das geografias urbanas (As Cidades, 1998; Carioca, 2006) e o das geografias e cicatrizes do amor (Chico, 2011). Começa por estas últimas, aliás, numa sequência notável.
Primeiro Tua cantiga. A música, de Cristóvão Bastos, inspira-se em Bach e Chico cita na letra, deliberadamente, um soneto de Shakespeare, escrevendo: “Ou estas rimas/ Não escrevi/ Nem ninguém nunca amou”. A discussão que Tua cantiga provocou foi, no entanto, muito menos erudita, apontando as juras de amor eterno do protagonista da canção (ao ponto de deixar mulher e filhos, tornando a amada “rainha” do novo lar) como a glorificação de um machismo antigo. Pois ouçam Blues para Bia e terão novo motivo para discussões idiotas: um homem, apaixonado por uma mulher em cujo coração “meninos não têm lugar”, diz que “nada o amofina”, nem mesmo isso: “Até posso virar menina/ Pra ela me namorar.” Aqui, o blues, presente em vários momentos da carreira de Chico; na anterior, lundu e Bach! Completando a trilogia, A moça do sonho, uma linda canção escrita em 2001 (com Edu Lobo) para a peça Cambaio e que Chico não gravara. Nela está presente outro elemento preponderante no disco: o tempo. O tempo e a infância. “Um lugar deve existir/ Uma espécie de bazar/ Onde os sonhos extraviados/ Vão parar.”

Esse mesmo tempo vai surgir em Jogo de bola (“É ver o próprio tempo num relance/ E sorrir por dentro”) e também em Massarandupió, onde Chico, autor da letra, fala da infância de outro Chico bem mais novo, autor da música, uma valsa quase infantil (“Lembrar a meninice é como ir/ cavucando de sol a sol”). O outro Chico é Brown, neto de Buarque e filho do casal Helena Buarque e Carlinhos Brown.
No tema seguinte, Dueto (de 1979, que Chico só cantara em projectos alheios, com Nara Leão, Zizi Possi ou Paula Toller), surge outra neta, filha do mesmo casal e irmã de Chico Brown: Clara Buarque. O dueto avô-neta, feliz na concretização, lembra, pela chama que o ilumina, os tocantes duetos de Tom Jobim com cantoras como Elis Regina ou Miúcha (por sinal, irmã de Chico Buarque).
E vão seis, das nove canções que o disco oferece. A sétima é outro achado, um bolero escrito (com Jorge Helder) para um disco de Omara Portuondo que não chegou a ser gravado e que ganha aqui outro peso e significado: Casualmente. É Havana (e Cuba), a contas com o seu passado (de novo o tempo), envolta numa bruma nostálgica que não se dissipará até a um reencontro: “Regressarei, oxalá/ algum dia a la ciudad”. Mescla de idiomas a lembrar outros de Chico (Joana Francesa, por exemplo) e citando um autor cubano, Sílvio Rodriguez, numa glosa de Pequeña serenata diurna, que Chico gravou em 1978: “Hasta el mar de La Habana es lo mismo, pero/ No es igual/ No es igual”.
A oitava canção, Desaforos, volta aos amores mas pelo seu avesso, num samba-canção bem torneado e de inspiração clássica. Por fim, As caravanas joga com estigmas e medos do presente (as favelas, os refugiados) e o peso do passado, o tempo outra vez: “E essa zoeira dentro da prisão/ Crioulos empilhados no porão/ De caravelas no alto mar”. Sim, a escravatura. Frente ao racismo actual: “Com negros torsos nus deixam em polvorosa/ A gente ordeira e virtuosa que apela/ Pra polícia despachar de volta/ O populacho pra favela/ Ou pra Benguela, ou pra Guiné.”
É a voz de Chico num mundo a virar-se ao contrário, no mundo de Trump, dos refugiados e do terror universalizado.
Chico Buarque, 73 anos feitos em Junho, com uma expressividade vocal a que a idade foi juntando o grão do tempo (sempre ele), tem em Caravanas mais uma prova do seu génio musical. Juntemo-nos lucidamente a esta caravana, que o resto são cantigas. 
In Publico
Nuno Pacheco
22 de agosto de 2017, 18:14 actualizado a 23 de agosto às 18:29

Quem não sente a arte como desconstrução do real?
Quem não entende a figura de estilo (hipérbole, entre outras) na arte?
Quem não entende o ouvinte como interpretante da arte?
Quem não confere à arte uma polissemia?
Quem não é capaz de ultrapassar a literalidade da arte?
Quem nunca sentiu saudade de um amor profundamente arrebatador como este?

Venham CARAVANAS de cantigas... 
que elas não serão somente
 as tuas cantigas, Chico Buarque!



                                              Lola

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Embora




Embora

Quero ir embora
largar esse pedaço de vida
que foi comum, num passado,
que me desconforta
me angustia
me martiriza
me faz doer a existencia
 ao qual, 
decididamente, não quero 
não vou voltar
nem sequer lembrar
na difícil viagem
de tempos perdidos
sem qualquer sonhar!

Quero ir
para um lugar sem barulho
onde impere o silencio do mar
ou na natureza adormecida
sem temor 
sem ardor no coração
sem noites perfuradas 
pela loucura de um chegar
que sempre se adivinhava
turbulento
castrador
violento
de tremor!

Quero
viver comigo só
numa harmonia que preciso
numa tranquilidade que exigo
numa serenidade que me abraça
num aconchego que desconheço
de uma existência subjugada
muito maltratada
tão enxovalhada
desiquilibrada
quase estilhaçada
por um não ser 
de prepotência
arrogancia
sem caracter
sem...nada!

Quero só
que sintas que
 quero ir embora
que  vou embora
que já sai há muito
e que vou por onde
o vento e o Mar me chamarem!
Vou dar-lhe as mãos e seguir juntinho 
à areia que a espuma estende
cada vez que me molha os pés 
e me diz:
"Não olhes para traz...
Mereces quem te admire!" 
 te cuide docemente,
te queira, delicadamente,
aninhar num dialogo saboroso...
num olhar de amanhecer suave, 
num enternecedor carinho pelo teu rosto 
de húmido veludo 
outrora desbotado
Agora determinado
até ao entardecer....


                                                Lola

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

A Morte e o Amor



A Morte e o Amor

Casal de idosos morre de mãos dadas depois de ver aprovado pedido para dupla eutanásia

O casal de 91 anos cumpriu último desejo, ao ver aprovado um raro pedido de dupla eutanásia.

Nic e Trees Elderhorst, ambos de 91 anos, morreram juntos na sua cidade natal, Didam, na Holanda. O casal de idosos morreu depois de ver aprovado o pedido para que ambos fossem submetidos a eutanásia, em simultâneo.

Estavam casados há 65 anos, mas nos últimos cinco tinham vindo a sofrer uma deterioração da saúde física e mental. Nic Elderhorst tinha mobilidade reduzida, consequência de um acidente vascular cerebral ocorrido em 2012, e a mulher, Trees Elderhorst, revelava também dificuldades em caminhar, além de perda de memória.

"Rapidamente ficou claro que ela não poderia esperar muito mais", afirmou a filha do casal em declarações ao jornal holandês The Gelderlander, citado pelo The Telegraph.

"O geriatra determinou que a nossa mãe ainda era mentalmente competente. No entanto, se o nosso pai morresse ela poderia ficar completamente desorientada, acabando num lar de idosos, algo que ela desesperadamente não queria. Morrer juntos era o seu desejo mais profundo", adiantou.

Outra das filhas revelou ainda que o casal deu um grande beijo de despedida, acabando por morrer de mãos dadas, de acordo com o planeado.

"É uma coincidência quando ambas as pessoas cumprem os requisitos da eutanásia ao mesmo tempo, portanto, pedidos duplos raramente são concedidos," disse Dick Bosscher, da Associação Holandesa de Voluntary Life Endding.


A Holanda tornou-se no primeiro pais a legalizar a eutanásia, em 2002; no entanto, é raro que um casal seja submetido a este procedimento em conjunto.
                                                                                                                                   
                                                                                                                                      In DN

14 DE AGOSTO DE 2017
17:12

Deverá ser respeitada a ultima vontade dos pacientes em estado consciente de decidir?



                                                Lola

domingo, 13 de agosto de 2017

Beijo


Beijo

Para onde viras a cabeça num beijo romântico?

Beijar tem muito que se lhe diga. Um novo estudo com dados de países ocidentais e não ocidentais revela que, além da maioria das pessoas inclinar a cabeça para a direita, são os homens (nos casais heterossexuais) que iniciam quase sempre o beijo romântico


Se pensarmos num gesto romântico, vem-nos logo à cabeça um beijo. E para o amor ficar mesmo no ar, pense num beijo na boca. Foram os segredos desse beijo que cientistas da Universidade de Bath Spa (no Reino Unido) e da Universidade de Dhaka (no Bangladesh) quiseram desvendar. Qual o resultado deste teste romântico? A maioria das pessoas quando beija inclina a cabeça para a direita. Portanto, se vira a cabeça para a esquerda, está em minoria. Mas há mais: entre os casais heterossexuais, os homens iniciam 15 vezes mais um beijo do que as mulheres; e se é destro tem maior tendência a virar a cabeça para a direita quando beija, mas se for canhoto roda mais a cabeça para a esquerda.

Este estudo sobre o beijo foi publicado recentemente na revista Scientific Reports, do mesmo grupo da revista Nature. Não é o primeiro estudo do género a ser feito no mundo. Em 2003, foi publicado um artigo na Nature em que os cientistas observaram 124 casais a beijarem-se em aeroportos, estações de comboios, praias ou parques nos Estados Unidos, na Alemanha e na Turquia. Percebeu-se que 64,5% dos casais virava a cabeça para a direita e 35,5% a virava para a esquerda. Depois desse estudo, outros têm confirmado estas observações. Outro trabalho mais recente, de 2016, na revista Laterality: Asymmetries of Body, Brain and Cognition, estabelecia distinções, dizendo que a lateralidade durante o beijo depende do contexto: existe a tendência para virar a cabeça para a direita nos casais românticos quando se beijam na boca, mas que numa situação de beijo entre pais e filhos (no rosto) há a tendência para inclinar a cabeça para a esquerda.

Agora, o estudo foi feito também com casais num contexto não ocidental. Foram observados 48 casais heterossexuais casados do Bangladesh, onde o beijo não é tão visto em público como no ocidente. Por exemplo, enquanto no mundo ocidental vemos um beijo na televisão e no cinema, no Bangladesh isso já não é tão frequente, de acordo com um comunicado da Universidade de Bath Spa. Esta é assim a primeira investigação sobre a inclinação da cabeça durante o beijo com um contexto não ocidental, refere o mesmo comunicado.

Neste estudo, os casais beijaram-se nas suas casas e depois entraram em salas separadas para contar a sua experiência. Viu-se então que cerca de dois terços dos iniciadores do beijo e dos receptores do beijo viravam a cabeça para a direita. Além disso, os homens iniciavam o beijo cerca de 15 vezes mais do que as mulheres.

E o facto de se ser destro ou canhoto também tem a sua importância ao beijar. Se for destro, vai ter tendência para virar a cabeça para a direita e se for canhoto provavelmente vai virá-la a para o lado esquerdo. Isto caso seja o iniciador do beijo. Se for o receptor, irá ter tendência para seguir o seu parceiro.

Parece que o beijo é bastante complexo e poderá assim estar relacionado com as ciências cognitivas e as neurociências. “Estes resultados interessantes são explicados pela influência da aprendizagem social ou das normas culturais e por uma potencial base neurofisiológica, que em conjunto trazem novas revelações sobre os mecanismos subjacentes ao comportamento de preferência lateral nos humanos”, lê-se no artigo científico. “Está bem documentado que os humanos têm tendência para virar a cabeça para a direita numa série de situações. Por exemplo, a maioria das crianças recém-nascidas prefere baixar a cabeça para a direita em vez da esquerda. Surpreendentemente, até os fetos humanos preferem virar a cabeça para a direita nas semanas finais de gestação”, refere ainda o artigo. “Se esta tendência fundamental é inata e se se estende até à vida adulta é uma questão persistente para as neurociências e a psicologia”, acrescenta, segundo o comunicado, o primeiro autor do estudo, Rezaul Karim, do Departamento de Psicologia da Universidade de Dhaka.

Também se observou que quando os participantes no estudo imitavam os movimentos da cabeça de uns dos outros enquanto beijavam, tanto os iniciadores como os receptores do beijo ficavam desconfortáveis. Os cientistas sugerem então que o acto de beijar é determinado pela forma como o cérebro distribuiu as tarefas pelos dois hemisférios. E que diferentes níveis hormonais (como a testosterona) e neurotransmissores (substâncias químicas mensageiras entre os neurónios, como a dopamina, envolvida em comportamentos de recompensa) podem ser distribuídos de forma diferente pelos hemisférios cerebrais, dando assim origem a que a cabeça tenha tendência para se inclinar para a direita.

“Este é o primeiro estudo que mostra diferenças entre os sexos na iniciação do beijo, com os homens a serem mais os iniciadores, e também que o virar da cabeça dos iniciadores do beijo tende a modular a direcção para onde viram a cabeça os receptores do beijo”, sublinha Rezaul Karim. “Com base no nosso trabalho teórico anterior, podemos agora criar novas hipóteses sobre a base neuronal deste comportamento.” Por sua vez, Michael Proulx, do Departamento de Psicologia da Universidade de Bath Spa e também autor do trabalho, acrescenta: “Este estudo é único, uma vez que nos dá um olhar sobre o comportamento privado numa cultura privada com implicações para toda a gente. Trabalhos anteriores não excluíam a aprendizagem cultural porque só tinham amostras ocidentais. Acontece que, como humanos, somos semelhantes mesmo que os nossos valores sociais sejam diferentes.”

Texto de Teresa Serafim • 27/07/2017 - 11:10


E eu que desconhecia que existiam 

particularidades nos beijos ocidentais 

e não ocidentais?




                                                Lola

A Morte e o Amor


A Morte e o Amor

MATAR E MORRER POR AMOR


"Quanto tempo, doutora? Diga-me a verdade, por favor. Tenho um filho com paralisia cerebral e tenho que deixar a vida orientada". A dura e dramática segunda crónica do blogue 'Cuidando e contando: crónicas de uma neuropediatra', da autoria de Teresa Temudo
I
- Dona Alice Constâncio Pereira, sala 27 - gritaram pelo intercomunicador.
- Está com sorte, hoje está pouco atrasada – disse a senhora sentada a seu lado.
Ajeitou a peruca que tendia a descair para testa, pôs-se de pé e pegou na carteira e no saco onde transportava o pano de crochet que nunca mais terminava.
- Espero que hoje não demore muito – disse à senhora de azul com quem estivera a conversar. Da última vez estava sempre a receber telefonemas e nunca mais acabava a consulta…Tenho o meu filho à guarda da vizinha e fiquei de o ir buscar à hora do almoço.
Dirigiu-se a uma porta que dava acesso ao corredor dos consultórios médicos. Algumas mulheres olharam-na com ar assustado. Já estava habituada. A roupa negra baloiçava-lhe no corpo esquelético. A peruca barata nem tentava disfarçar… De manhã, ela própria quase se assustara ao ver-se, sem querer, no espelho da casa de banho. Já não tinha cor, ou se a tinha era cinzento-esverdeada. As olheiras fundas, a falta de sobrancelhas, a magreza a acentuar as rugas e, ainda por cima a calvície, faziam dela uma personagem de filme de terror. Só ao filho aparecia naquela figura. Tinha que ser.
O intercomunicador gritou de novo:
- Dona Alice Constâncio Pereira, sala 27!
A porta da sala estava aberta. Lá dento, à esquerda, a médica esperava-a atrás da secretária. Gostava dela. Era de poucas falas, mas também não lhe mentia. A primeira vez que a conhecera, já lá iam 6 anos. Quando lhe aparecera o nódulo na mama esquerda. Nessa altura, ainda com o marido vivo, ela tinha-lhe dado a notícia.
- É um carcinoma muito maligno. À partida, o prognóstico é muito mau. Vamos fazer exames para ver se tem metástases noutros órgãos.
A partir daí, não mais se livrou do Instituto de Oncologia. Tiraram-lhe a mama e os gânglios afectados. A seguir fez quimio e radioterapia. Ao fim de um ano de tratamentos, disseram-lhe que estava curada, mas que tinha que fazer controlos regulares. Cinco anos depois, foi-lhe detectado um carcinoma na outra mama. Desta vez tinha também metástases no fígado e ossos. Estava tramada, não tinha safa. Mesmo assim, recomeçaram o tratamento. Cirurgia, com novos ciclos de quimioterapia. Pelo filho. Só fazia isto pelo filho. Que seria dele quando ela morresse? Ninguém o queria…
- Então, Dona Alice? Como se sente? - perguntou a médica.
- Cansada, Doutora. Muito cansada. Tenho vomitado muito com a quimioterapia e quase não consigo comer. Neste mês já se foram quatro quilos.
- Vou-lhe receitar uns comprimidos mais fortes para o enjoo e uma vitaminas. Sempre ajudam qualquer coisa.
- Ó doutora, desculpe pedir-lhe. Pode-me passar os medicamentos da epilepsia do meu Toninho? É que me custa tanto ir ao Centro de Saúde…
- Não há problema nenhum, dona Alice. Eu passo a receita. Como é que ele está?
- Como sempre doutora. Hoje ficou com a minha vizinha. Tenho que chegar a tempo de lhe dar o almoço.
A médica pediu-lhe ainda umas análises e marcou a próxima consulta. Desta vez tinha demorado pouco. Não lhe tinham telefonado…
Quando saiu, a senhora de azul ainda esperava. Coitada, também estava cheia de metástases!
II
À saída do Instituto, avistou a paragem de autocarros. Credo, tanta gente à espera! Como sempre, os lugares sentados estavam ocupados. Custava-lhe tanto estar de pé! Ao fim de uns vinte minutos, lá chegou o trezentos e vinte. Vinha meio vazio e conseguiu um lugar à beira da janela. Era bom ser conduzida. Aquele tempo era só seu e podia ir pensando à vontade. Às vezes, em horas de ponta, divertia-se a ouvir as conversas dos passageiros. Da janela avistou as árvores ao longo da avenida. Estava tudo a despontar. Era tão bonita a Primavera! Outrora, quando era nova, sentia todos os anos uma energia renovada. Até parecia que lhe brotavam folhas dos dedos!
Conhecera o Artur nessa estação, viviam ainda os dois em Cabeceiras. Eram filhos de lavradores e esperavam deles que continuassem a trabalhar as terras. Mas ele tinha ideias diferentes e decidiu, depois de casar, que viriam tentar a sorte para o Porto. Arranjou um lugar na polícia e ela começou a fazer limpezas numas senhoras. No início viviam num quarto alugado, na rua da Firmeza. Ao fim de um ano, já tinham poupado o suficiente para a mobília e alugaram uma casinha. Foram tão felizes aqueles tempos! Ao domingo tomavam o eléctrico e iam lanchar para a Foz.
O autocarro parou finalmente na Praça da Liberdade. Tinha que sair e apanhar um outro para ir para casa. Na Praça, o sol iluminava a Câmara, lá ao fundo. Estava bonita, a cidade! Tinham começado a recuperar as casas antigas do centro e agora muita gente nova animava a cidade à tarde e à noite. Apanhou o segundo autocarro. Eram só quatro paragens até casa. Saíu no Marquês e aproveitou para comprar uns legumes na mercearia. Conhecia o dono desde há muitos anos.
- Então dona Alice, hoje o que vai ser?
Era um bom homem, aquele senhor Manuel. Quando o seu Artur ainda era vivo, mandava-lhe sempre o jornal ao fim do dia, depois de o ler. Sabia que ele gostava de ler as notícias… A mulher do senhor Manuel também era diabética, mas tinha mais cuidado que o Artur e ainda estava bem boa.
Escolheu as couves e pagou. De repente um suor frio inundou-a e uma náusea subiu por ela acima. Encostou-se ao balcão de olhos fechados.
- Está-se a sentir mal dona Alice? Quer sentar-se?
- Isto já passa. Pode-me arranjar um copo de água?
Bebeu a água, ainda de olhos fechados e esperou um pouco antes de partir. Desde há uma semana que aquilo lhe dava a toda a hora.
III
O bairro onde morava era pobre, mas tinha algumas vantagens. Conheciam-se todos e ajudavam-se nas muitas crises por que iam passando. À entrada da sua casa, o Pirata dormitava, enrolado no tapete. Estava velhinho, coitado. Antes, vinha ela no meio da rua e já ele começava a ganir, impaciente. Agora, só dava conta dela quando já dentro da porta. Levantou-se a custo e conseguiu saltar uma vez. Os olhos, outrora brilhantes e negros, eram duas manchas opacas e inexpressivas. Seguiu-a para a cozinha, onde a vizinha dava o almoço ao filho.
-Então Maria, que tal se tem ele portado?
-Já lhe dei a sopa. Estava agora a tentar dar-lhe o conduto ,mas ele já me parece enfartado. Podes terminar tu? É que tenho o meu neto a chegar da escola…
-Vai mulher, muito obrigada. Se não fosse a tua ajuda…
Alice sentou-se em frente do filho e, automaticamente, arranjou-lhe o cabelo que tombava para a testa e compôs-lhe a gola da camisa. Era tão bonito o seu Toninho. Não fora a doença... O filho tentou endireitar a cabeça e olhou-a de viés, rindo daquela maneira peculiar, com esgares repetidos da boca. A baba escorreu-lhe em fio pelo lábio inferior e Alice, rapidamente ,puxou a babete e limpou-o. Já tinha barba, mas continuava a ser o seu menino. Dependia dela para tudo. Que seria dele quando… Tinha que ter uma conversa séria com a médica . Quanto tempo lhe restava?
IV
- Quanto tempo, doutora? Diga-me a verdade, por favor. Tenho um filho com paralisia cerebral e tenho que deixar a vida orientada.
A médica baixou a cabeça e olhou fixamente para os papéis espalhados encima da secretária. Era raro os doentes quererem saber a verdade. Percebeu, no entanto, que era importante dizê-la àquela doente. Tinha metástases no fígado, ossos, pulmões…
- Uns três meses, dona Alice, não mais que isso.
- Obrigada doutora. Eu sei que também não é fácil para si.
Levantou-se a custo e dirigiu-se para a saída. A morte é isto, pensou. É já não ter futuro. Eu já morri.
V
- E o Toninho? Quem fica com o Toninho quando eu morrer? – deu mais uma volta na cama e virou-se para a esquerda. Na mesa de cabeceira, o relógio mostrava serem quatro da manhã. Não adiantava, era melhor levantar-se. Vestiu o roupão e foi à cozinha fazer uma cevada. O Pirata abriu os olhos e levantou a cabeça, mas deixou-se estar enroscado no ninho. Na mesa coberta de oleado, num cesto de verga, ao centro, estavam os inúmeros medicamentos, dela e do filho. Ao lado, inacabado, o pano de crochet que andava a fazer. Sentou-se, ligou o rádio portátil e começou maquinalmente a tricotar, aguardando que a cevada “assentasse”. O Marante cantava.
Quando partiste foram contigo os meus desejos
Quando partiste foram contigo os meus abraços,
Quando partiste nunca supus que à despedida
Ia contigo naufragar a minha vida
Lembrou-se das tardes de domingo passadas na academia Apolo. Bons tempos esses....Tanto que o Artur gostava de dançar! Ao princípio ela não apreciava, tinha sido criada para trabalhar, nada mais. Com o tempo ele foi-lhe ensinando a gozar a vida. Como ele gostava de viver! Tinha amigos em todo o lado, cantava, tocava cavaquinho, dançava, gostava de comer e conversar pela noite dentro. Meu Deus, que saudades! Quando ela ficava triste por causa do Toninho, logo acudia ele para a alegrar.
- Então mulher, que é isso? Nós somos tão felizes! O Toninho é assim, porque tinha que ser assim. Não penses, mulher. Toca para a frente que atrás vem gente!
Mas, de certa forma, o optimismo dele fizera com que agora o Toninho estivesse naquela situação ...
O filho tinha estado na escola. As professoras do Ensino Especial, que estavam diariamente com ele, tratavam-no muito bem e tinham muita pena dela, ainda mais quando souberam da sua doença. Sabia que o filho só poderia ficar na Escola até aos 16 anos. Depois… As professoras tinham-lhe falado que seria melhor pensar num Lar para o internar … que seria um caso difícil de cuidar em casa, até pelas doenças deles. Quiseram ajudar na inscrição do Toninho num Centro de Atividades Ocupacionais; fizeram relatórios; sugeriram os três Centros que existiam próximos da área de residência; avisaram que poderiam ter de esperar por uma vaga. Não lhe agradou esta mudança para o desconhecido. Que pena que não pudesse continuar naquela Escola e com as professoras em quem confiava. Telefonou ainda várias vezes para um dos Centros, tentou falar com a assistente social. Ao fim de meses de insistência, conseguiu agendar reunião para inscrição do filho, mas foi-lhe dito que tão cedo não tinham vaga, ainda mais necessitando de transporte na carrinha do Centro. A lista de espera era de mais de 200 e havia casos que eram mais graves que o seu filho, jovens sem família ou com família que os não cuidava. Foi visitar o Centro e não gostou do que viu. Pareceram-lhe crianças e adultos demais para a quantidade de pessoas para os cuidar. Estavam para ali sentados nas cadeiras de rodas, uns curvados, outros amarrados com lençóis às cadeiras, muitos virados para uma grande janela onde apenas se via um céu imenso, carregado de nuvens cinzentas. Sim, o dia também não tinha ajudado...Os invernos no Porto são tristes quando não há sol. Como é que o Toninho seria ali cuidado? Como é que podia separar-se do filho para o entregar ali, permanecendo o dia inteiro, se calhar todo sujo, sem o limparem, sem o alimentarem, em frente àquela janela… Deixou a inscrição, mas ela e o marido decidiram que o Toninho ficaria em casa, quando a Escola não o aceitasse mais. Telefonaram do Centro, passados 2 anos, perguntando se ainda estavam interessados em manter a inscrição …. Ainda não era sequer para o admitirem… Disseram que não. Afinal ele estava tão bem com eles! O que custava mais era o esforço para o vestir e dar banho... Soube então que poderia contratar um serviço de Apoio Domiciliário – o Centro mandava diariamente alguém para lavar e vestir o filho. Tinham de pagar, conforme os rendimentos. Apresentaram os papéis para que os mesmos fossem apurados e calhou-lhes pagar uma quantia mensal que mal podiam aguentar... Ainda por cima as funcionárias faltavam muitas vezes… Estiveram assim uns meses e desistiram. O Toninho ficou então só para eles…
VI
Abriu a porta do roupeiro para arrumar as roupas que usara no dia anterior. Estava muito cheio. Nunca tivera coragem de retirar as roupas do marido. As camisas, as calças, as gravatas penduradas na porta, os sapatos deformados, os chinelos de quarto, o casaco de malha velho com que andava em casa, ainda ocupavam todo o lado direito do armário. Era uma pessoa tão boa! Tinha morrido de uma forma estúpida, há menos de um ano. Segundo os médicos, tinha-se provavelmente enganado e injectara uma dose excessiva de insulina. Por azar, ela estava nessa altura internada e não lhe pudera valer. Como ele não tivesse aparecido na hora da visita, telefonara à vizinha para saber o que se passava. Tinham-no já encontrado morto, ainda na cama. O médico disse-lhe que devia ter entrado em coma e não sofrera. Ao menos isso.
E se…
Acabou de arrumar a roupa e foi à cozinha. No aparador abriu uma das gavetas. Sim, ainda lá estava o estojo com várias ampolas e as seringas de insulina. Fez as contas e viu que eram doses suficientes para mais de duas semanas. Devia chegar para os dois.
VII
Terminado o jantar, deu banho ao filho. Vestiu-lhe um pijama novo e deitou-o na sua cama. Em seguida lavou-se e vestiu a melhor camisa de noite. Decidiu não tirar a peruca.
Em cima da cómoda estavam já poisadas várias seringas cheias. Metodicamente, injectou três na coxa do filho. Ele gemeu um pouco e ela olhou-o. De repente sentiu-se uma assassina e, a soluçar, abraçou-o. Mas logo se calou e limpou a cara. Deitou-se ao seu lado e injectou nela as três seringas que restavam. Apagou a luz, abraçou o filho e rezou ao seu Deus.
Sentiu finalmente paz. Ninguém os separaria.
in Revista visão
12.08.2017 às 8h31


Pediatra e Neuropediatra no Centro Hospitalar do Porto. Doutorada em Ciências médicas. Professora de Pediatria no curso de medicina do ICBAS. Investigadora em doenças de movimento na criança e perturbações do espectro do autismo.



"Quanto tempo, doutor?
Três a seis meses!
E sofre?
Não. Entra em coma e depois apaga-se lentamente!"

Este foi o dialogo que tive, há cerca de dez anos, num dos corredores do Hospital de Santo António, no Porto! 
Uma filha adolescente estava para partir...depois deste dialogo ficou comigo apenas um mês!
Mas eu não desisti! 
Fiquei cà cuidando dos que de mim precisavam!
Mas que há dores amargamente insuportáveis...isso hà!
Um abraço de Saudade a esta mãe que partiu abraçada ao seu filho!
Um carinho especial à autora de um texto, cujas palavras sei de cor...
                                            Lola