O sonho da Melancia
Como era habitual sempre que Setembro chegava, Rita acordara naquela manhã ansiosa para não perder um pouquinho que fosse de toda a animação que decorria nas festas da aldeia!
Era os carrosseis, as cestinhas, as farturas, os feirantes a apregoar os seus produtos, os ranchos a dançar na praça e aquela imensidão de gente avenida acima...avenida abaixo num ritmo tao previsível que visto do cimo se afigurava uma marcha há muito tempo ensaiada!
Rita nao podia faltar!
E, desde a sua pequenita infância, notava já o olhar curioso das senhoras que, de soslaio, espreitavam cuidadosamente os modelitos das outras senhoras da aldeia que tinham sido feitos por medida para exibir nas festas, verdadeiro palco de desfile de elegância em vestidos graciosos de chita da tabela, que os dinheiros não abundavam...mas isso nunca fora obstáculo ao bom gosto de uma mulher que se preze em, coloridamente, agradar!
A mãe de Rita, no dia da festa, vestia-lhe a roupa do domingo e a miúda tinha direito a calçar o par único de sapatos pois para o resto da semana tinha umas sandálias de pele bege que lhe protegiam os pés, num tempo em que não era raro ver as mulheres do campo andarem descalças pela rua!
Ora, numa das tardes do fim de semana das festas...talvez no sábado...que a memoria não é tao precisa quanto se pensa, um tio de Rita quando esta falou em casa dos avós que tinha visto um feirante a vender umas melancias redondinhas e mais pequenas do que bolas de futebol...deu-lhe uma moeda para ela ir comprar uma melancia que lhe refrescasse o olhar e antecipasse o prazer de se deliciar fatia a fatia!
Rita nem olhou para trás!
Com o seu bibe vestido, sim, porque em casa não se andava com a roupa de sair, lavou apressadamente a cara e as mãos e correu rua abaixo em busca do senhor que lhe havia de vender, em troca da moeda, a melancia que ela, há muito queria saborear!
Compra feita, Rita ainda tivera que esperar um pouco pois estavam muitas pessoas à sua frente, Rita correu de novo para casa dos avós que a sua mãe contava-lhe o tempo e iria à sua procura se ela tardasse!
Rita tinha nas suas mãos, uma pequena melancia que iria deliciar o seu olhar de menina e refrescar o seu desejo de sabor em vermelho pintado!
Mas...
poucos metros antes de chegar a casa, já mesmo na rua, Rita, ainda hoje nao sabe como, tropeçou...e a sua melancia, uma bolinha redonda que transportava sabores e algum sonho...partiu-se em mil bocados e espalhou-se pelos paralelos da rua perante o olhar inconsolável de Rita!
Restou-lhe chegar a casa...e mostrar dois bocados que apanhara, apenas para provar que comprara a melancia...mas que o sonho se desmoronou quando, sem querer, tropeçou ao fundo da rua...mesmo, mesmo a chegar a casa!
Rita não chorou...entristeceu apenas num sonho despedaçado...outrora juntinho naquela forma quase perfeita e sedosa de uma desejável...
...e inesquecível Melancia!
Lola